Uma carta para todos os meus amigos, leitores e simpatizantes!


Recaídas acontecem. Luto contra a anorexia desde 2006, quando comecei a mutilar meu corpo por nutrir ódio por ele. Nunca usei laxantes, diuréticos ou inibidores de apetite. O método era o exercício extremo: malhava de duas a três horas sempre que comia algo como um pedaço de bolo, na tentativa de "expurgar" a culpa. Minha alimentação era mínima, movida pelo pavor de engordar, mesmo que, no auge da doença, eu pesasse menos que uma menina de oito anos.

Ainda não se sabe o que realmente motiva o desenvolvimento da anorexia nervosa, pois cada paciente traz uma história única. Fatores emocionais, como o medo do fracasso, o perfeccionismo extremo, o bullying ou eventos traumáticos, podem ser gatilhos. No meu caso, em 2006, o fim do ensino médio foi um fator significativo. Separar-me dos meus melhores amigos e perder o contato com pessoas da minha idade me deixou à deriva. Eu não sabia o que queria fazer na faculdade e era bombardeada por opiniões e cobranças sobre escolher uma profissão.

Além disso, fui influenciada pelo que consumia na mídia. Programas como TV Fama e A Tarde é Sua, precursores de sites de fofoca atuais, reverenciavam a magreza como símbolo de beleza. Eu via atrizes jovens com corpos “esculturais” sendo exaltadas e me sentia imensa perto delas. Decidi que, dos 53 kg que pesava na época, reduziria para 45 kg.

Apesar de ser uma adolescente sedentária, determinei que emagreceria. Tinha um aparelho de ginástica em casa e, durante o Jornal Hoje, comecei a malhar. Queria caber em uma calça que amava, mas me assustava por estar usando tamanho 44. Perdi 1 kg no primeiro mês.

Naquela época, minha rotina era, literalmente, "pão e água". Meu estado emocional era devastador: chorava constantemente, sentia-me suicida e não tinha o consolo que hoje encontro nas plataformas digitais para me expressar. Em 2006, eu estava completamente isolada.

Durante a Copa do Mundo na Alemanha, minha relação com a comida só piorou. Se comia meia barra de chocolate, gastava horas malhando para compensar. Sentia culpa ao menor deslize, como comer um pedaço de bolo ou pizza. Em julho, quando me inscrevi para o cursinho, já tinha perdido peso, chegando a 48 kg, mas me sentia frustrada.

Minha obsessão aumentou. Comecei a pedalar na bicicleta ergométrica como se fosse um trajeto diário até o colégio—40 minutos por dia. Em agosto, aumentei para uma hora de exercícios todos os dias. Em outubro, meu peso despencou de 46 para 40 kg.

Lembro-me do alvoroço na imprensa com a morte da modelo Ana Carolina Reston. Aos 40 kg, ela não resistiu às consequências da anorexia. Meus pais começaram a desconfiar de que algo estava errado comigo, mas eu negava. Pensava: “Ela era alta, modelo. Eu sou baixinha e nem estou tão magra assim.” Até que, ao tentar vestir calças que antes não fechavam, percebi que agora estavam largas.

No final de 2006, durante um almoço na casa da minha avó, meus familiares ficaram chocados com a minha aparência. Meus pais, alarmados pelas notícias sobre anorexia e blogs pró-ana/mia que proliferavam na época, começaram a cuidar melhor da minha alimentação.

Ana – Anorexia
Mia – Bulimia
LF – Low food (pouca comida)
NF – No food (nada de comida)
Miar – vomitar
Thinspiration – meninas/mulheres com corpos esquálidos que nesses blogs são veneradas por serem consideradas inspirações magras

 Em 2007, eu não conhecia os blogs pró-ana/mia. Porém, em 2008, por causa de falsas amizades que prefiro não mencionar, comecei a acreditar que era rejeitada nos passeios e baladas porque "era gorda"—o que era uma distorção cruel, já que eu pesava apenas 42 kg. Foi nesse período que passei a visitar esses blogs, deixando meu cursinho em segundo plano para me concentrar em emagrecer.

Dois anos antes, em 2006, eu havia me assustado com o ritmo do cursinho, com suas seis aulas por dia, e fui apenas uma vez. Já em 2008, a experiência foi diferente. Conheci um professor especial que me inspirou profundamente e de quem aprendi muito sobre escrita. Além disso, a turma era acolhedora, cheia de pessoas da minha idade, e acabei fazendo algumas amizades durante o curso semiextensivo.

Naquele ano, a UFPR aplicava as provas em novembro. Tivemos três meses e meio de aulas intensas, divididas em quatro apostilas, e depois participamos do “Super I,” um período de três semanas dedicado à revisão de todo o conteúdo. Com a mudança de sede, no intervalo do primeiro dia, minha amiga e eu saímos para comprar balas de goma que ela adorava. Passamos na farmácia e decidimos nos pesar. Ela ficou chocada quando a balança marcou 40,2 kg para mim — usando duas blusas, calça jeans e All Star. Na realidade, eu devia estar com cerca de 38 kg, já que só o All Star pesa quase um quilo.

Fiz a prova do vestibular no dia 16 de novembro, um dia antes do meu aniversário de 20 anos, que foi completamente arruinado. Fui mal na prova e não passei, o que me devastou, pois esperava um resultado diferente. Minha amiga passou em Letras – Italiano e, algum tempo depois, trocamos de MSN e acabamos perdendo contato.

Lembro-me de ouvir comparações injustas: embora minha nota tenha sido maior, meu curso era o segundo mais concorrido daquele ano, com quase 30 candidatos por vaga. O curso dela, com menor procura, tinha dois candidatos por vaga. Na época, eu não sabia muito sobre esses fatores e respeitei a conquista dela, mas era difícil lidar com a sensação de fracasso.

Após o vestibular, meu peso caiu ainda mais. Em março de 2009, durante uma consulta com um clínico geral, fui pesada e meu IMC era 14—um número assustador. Foi o momento em que me dei conta: ou eu aceitava ajuda, ou o desfecho seria fatal.

Aceitei o tratamento de bom grado e colaborei desde o início. Nunca tinha ido a um psiquiatra antes, mas a Dra. Carol foi incrivelmente gentil comigo. Apesar da minha condição, ela me deu um voto de confiança e me pediu para levar, na consulta seguinte, um "diário de alimentação," anotando tudo o que comia, como me sentia e minhas reflexões sobre cada refeição. Eu me comprometi com o processo, e, ao longo de 2009, compareci mensalmente para acompanhar meu progresso.

Nesse período, fui proibida de fazer exercícios aeróbicos e meus pais venderam o aparelho de ginástica. Meu plano alimentar exigia refeições a cada duas horas. A Dra. Carol me diagnosticou com Fobia Social, Depressão e Anorexia Nervosa, prescrevendo Paroxetina. No entanto, ao tomar o remédio à noite, passei quatro noites em claro. Ajustei o horário para após o almoço, acompanhando com uma salada de frutas (mamão com banana), o que ajudou.

Minha primeira psicóloga foi a Dra. Selena, uma senhora amável que chegou a me atender até três vezes por semana no início. Ela adorava ouvir sobre minha novela A Governanta e, numa das sessões, até o cardiologista do meu pai se interessou pela história. Ambos ficaram ouvindo enquanto eu narrava sobre Gui, Raquel, Lipe, Tata e os vilões.

Durante esse período, fiz exames de sangue, consultas com nutricionista, eletrocardiogramas e segui o tratamento. Contudo, quando comecei a cursar Letras, precisei interromper as sessões com a Dra. Selena devido à incompatibilidade de agendas.

Infelizmente, cursar Letras acabou sendo prejudicial ao tratamento. Enfrentei preconceito por minha magreza e por minha idade—sendo que eu tinha apenas 20 anos. Algumas meninas da turma me deixavam desconfortável com comentários maldosos e não entendiam que minha situação exigia uma dieta específica, incluindo alimentos como chocolate, para repor calorias. Levei meses para alcançar 41 kg.

Gostava das aulas de Inglês e me destacava. Tirei 99 na primeira prova, a maior nota da sala. No entanto, eu não compreendia a diferença entre bacharelado e licenciatura, e as disciplinas do primeiro semestre eram muito voltadas à formação de professores. Isso me desmotivava, pois nunca quis dar aulas.

Acabei desistindo do curso, e não me arrependo. Sofri bullying e discriminação, o que agravou meu estado emocional. Ainda assim, foi durante essa época que comecei a escrever sobre bullying na internet, explorando relatos em comunidades no Orkut. Descobri que muitas pessoas compartilhavam experiências similares às minhas.

Embora Letras não tenha sido minha vocação, admiro quem segue o curso, se engaja e contribui para a sociedade com sua formação. Meu sonho nunca foi ser professora, e a pressão do curso parecia um peso enorme. Sentia que estava ocupando a vaga de alguém que poderia aproveitar mais aquela oportunidade. Curiosamente, das meninas que me criticavam por ser “velha,” ninguém permaneceu na área.

Em janeiro de 2010, tentei o suicídio consumindo uma cartela inteira de paroxetina. No entanto, em vez de dormir eternamente, passei a noite inteira em claro. Nunca contei à Dra. Carol sobre isso, pois sabia que ela teria me internado imediatamente.

Entre abandonar a faculdade e essa tentativa, comecei a me consultar com outra psicóloga, a Dra. Alana. Infelizmente, ela foi uma experiência negativa. Criticava meu jeito de me vestir, interrompia minhas falas e demonstrava zero empatia. Eu saía de suas consultas pior do que entrava. Eventualmente, deixei de marcar sessões, mas a Dra. Carol insistia que eu precisava de acompanhamento psicológico, além de manter os exames de sangue em dia.

Em agosto de 2010, fui internada no Hospital-Dia (HD), pois a Dra. Carol acreditava que eu precisava de um tratamento mais intensivo do que ela poderia oferecer no ambulatório. No HD, eu chegava às 8h e saía às 16h. Logo no primeiro dia, conheci minha nova psiquiatra, a Dra. Delly, uma mulher iluminada, comprometida e humana. Ela era tão acessível que comia pão com queijo quente na cozinha do HD e promovia palestras semanais com temas edificantes.

A Dra. Delly me recebeu calorosamente, explicando que o tratamento poderia ser longo, mas que ali eu teria toda a assistência necessária. Ela me fez enxergar que eu estava sacrificando minha vida por um padrão de beleza misógino, imposto por homens que odeiam mulheres.

No HD, meu psicólogo “padrinho” era o Rodrigo, que coordenava sessões de psicoterapia em grupo às segundas e quartas. Às terças e quintas, outro grupo era liderado pelo José. Também havia a Maysa, assistente social sempre cordial, e a Elza, enfermeira-chefe que cuidava das aulas de artesanato.

Eu queria muito participar da turma que aprendia a mexer com o tear, mas não havia vagas. Ainda assim, o HD tinha uma rotina estruturada: assinávamos uma lista de presença, alguns tomavam café no refeitório, e depois nos reuníamos na sala principal para ouvir os psicólogos anunciarem as atividades do dia.

Às segundas-feiras, recebíamos nossas doses de medicação. Eu tomava fluoxetina pela manhã (não lembro a dosagem), 300 mg de carbonato de lítio e 0,5 mg de risperidona à noite. Na segunda noite com risperidona, acordei com formigamento na cabeça e nas pernas. Apesar do susto, consegui caminhar até o banheiro e voltar para a cama.

Tive uma crise de choro no HD, tão intensa que passei mal. O Dr. Rodrigo me deixou chorar, dizendo que eu precisava liberar aquele sentimento. Ele explicou que o tratamento era uma via de mão dupla: eles fariam a parte deles, mas eu também precisava fazer a minha. Recebi um abraço coletivo e orações, mas ainda pedi alta à Dra. Delly. Ela recusou, explicando que os efeitos colaterais iriam passar e que meu exame apontava deficiências graves de vitaminas do complexo B. Ela recomendou carne vermelha e suplementos de vitamina B-12.

Naquele mesmo dia, depois de tanto chorar, adormeci na enfermaria. A Dra. Delly me cobriu como se eu fosse sua neta. Nas duas primeiras semanas no HD, meu sono se regularizou, meu humor melhorou e aprendi a fazer chaveirinhos de miçanga. Conheci pessoas novas e, se continuasse progredindo, poderia voltar ao ambulatório em breve.

Infelizmente, retomei contato com pessoas que prejudicaram meu tratamento. Elas não tinham empatia, desviaram meu foco e me caluniaram, chamando-me de louca. Naquela época, o que eu menos precisava era de alguém pressionando para que eu namorasse. Antes disso, eu precisava me curar ou, ao menos, estar apta a voltar a estudar. Essas intromissões me levaram a pedir alta com apenas dois meses de internação, embora a estimativa fosse de quatro meses. Recaídas eram esperadas, e eu as tive.

Uma das razões para minha recaída foi a sensação de inadequação. As meninas com quem eu andava estavam namorando, e eu era a única solteira. Elas me faziam sentir complexada, mesmo sem eu gostar de ninguém em especial. Uma delas, muito magra, romantizava transtornos alimentares, o que era inaceitável para alguém em tratamento.

Os efeitos colaterais da medicação também foram desafiadores. O carbonato de lítio causava inchaço, e meu corpo retinha líquidos. A risperidona provocava tremores nas mãos, comprometendo minha escrita. A única vantagem era que eu dormia bem. Arrisquei-me ao fazer o desmame dos remédios por conta própria. A Dra. Delly insistiu que eu continuasse o tratamento fora do HD, mas eu não queria passar a vida tomando medicação ou frequentando consultórios. Mais tarde, descobri que o acompanhamento ideal dura pelo menos três anos, com consultas regulares a psiquiatras e psicólogos.

No HD, eu era tratada como um “bibelô” por ser uma das pacientes mais jovens. Os outros internos me tratavam bem, mas, como havia casos mais graves, meu transtorno alimentar não era prioridade. Após 2011, meu foco foi alcançar um peso que não colocasse minha vida em risco. Mas a ferida que me faz enxergar meu corpo como inimigo nunca foi tratada.

Em 2013, consultei-me com a Dra. Meg, uma psicóloga mais velha, como a Dra. Selena. Foi com ela que chorei a morte do Chorão. Ela me disse que era normal sentir tristeza e que estava tudo bem desabar. Naquela época, chorei até com o fim da reprise de Gotinha de Amor (#mejulguem).

A Dra. Meg me dava lições semanais para refletir, mas, por ser muito procurada, nem sempre tinha vagas. Por isso, não dei continuidade às consultas, embora ela fosse uma excelente profissional.

Em 2014, consultei-me com uma psicóloga mais jovem, mas a experiência foi frustrante. Ela parecia mais preocupada com minha virgindade do que com minha saúde mental. Quando perguntei se havia algum problema em ser virgem aos 25 anos, ela me olhou com deboche. Percebi que ela era uma versão loira da Dra. Alana e decidi não insistir.

Em 2015, sofri um abuso sexual. Muitas pessoas me perguntam: “Você passou por tudo isso sem procurar ajuda psicológica?” E minha resposta é direta: “Sim, não tive escolha.”

Diferentemente do passado, quando eu simplesmente parava de comer, dessa vez passei a lidar com compulsões alimentares. Só percebi que estava me prejudicando quando vi 55 kg cravados na balança. Para alguém que pesava 45 kg em 2015, esse ganho de 10 kg foi um choque.

Desses 10 kg, consegui perder seis nos últimos três meses, e hoje estou com 49 kg. Ainda assim, sei que se tivesse feito o tratamento com retidão e comprometimento no passado, isso não teria me tornado imune às recaídas, mas me daria mais autonomia para lidar com elas. Esses pensamentos intrusivos desestabilizam não apenas a mim, mas também aqueles que me amam e se preocupam comigo, e por isso peço desculpas.

O tratamento adequado para um transtorno alimentar—seja ele qual for—exige acompanhamento por uma equipe multidisciplinar. Isso inclui um psiquiatra com quem a paciente tenha empatia (como eu tinha com a Dra. Carol, que também era de escorpião), uma psicóloga para sessões semanais, especialmente nos momentos mais críticos, uma nutricionista, um clínico geral e uma checagem regular do coração.

Profissionais engajados podem fazer um trabalho incrível, mas, para que haja progresso, é fundamental que a paciente também colabore. Além disso, é essencial que familiares e amigos recebam orientação sobre como lidar com alguém que vive com anorexia.

Mandar engordar? ESQUEÇA! É importante lembrar que uma pessoa anoréxica sente PAVOR de ganhar peso. Antes de julgar como “frescura” ou dizer que alguém com anorexia “merece morrer,” reflita se, em algum momento, você não fez comentários gordofóbicos disfarçados de humor ou “conselhos para o bem.”

Eu também não quero me misturar com pessoas que criticam quem consome carne, queijo ou derivados. Estou tentando me curar de desordens alimentares e desejo voltar a ter uma relação saudável com a comida, como a que tive até os 15 anos. Por favor, respeitem isso. Eu não sou uma “carnívora assassina” ou alguém sem compaixão.

Entendam que estou prestes a completar 30 anos. Meu metabolismo é de uma mulher adulta. EU SOU UMA MULHER. Não comparem meu corpo com o de uma adolescente de 16 anos que só come castanhas ou de uma artista que pode pagar por procedimentos estéticos para ter a tão famosa “barriga negativa.”

A anorexia já roubou 12 anos da minha vida. Tirou minha juventude, me arrancou lágrimas e causou sofrimento às pessoas que amo. Por isso, pensei em abordar esse tema em Simplesmente Tita. Essa personagem, que criei aos 15 anos e que me fez companhia aos 20, poderia ser um canal para discutir como o tratamento realmente deve ser feito.

Quero usar minha arte para explorar um tema que é muitas vezes mal representado pela mídia e pouco compreendido pelas pessoas, que ainda o encaram com preconceito. Falar sobre anorexia não é apologia. É uma tentativa de ajudar pais e filhas a dialogarem, pois, embora a anorexia também afete homens, sua incidência é maior entre mulheres — especialmente adolescentes e jovens adultas, mas também mulheres mais maduras. 

Em tempos de redes sociais, é essencial ter cuidado para não adoecer com as modinhas e padrões tóxicos propagados no Instagram e em plataformas semelhantes. Minha voz, através da escrita, é minha forma de ajudar. Infelizmente, ainda não estou pronta para exercer um trabalho de conscientização e auxílio, porque seria hipócrita pregar algo que eu mesma não coloco em prática.

Sei que dificilmente alguém lerá este texto até o fim, mas esta é a minha história. A história de alguém que carrega cicatrizes na alma, deixadas por uma doença que, silenciosa, te consome pouco a pouco. Você não percebe porque está obcecada em buscar uma perfeição que não existe. Esse ideal de um “corpo perfeito” é vendido como o passaporte para o amor, a aceitação e a realização pessoal, mas, no final, torna todo o resto irrelevante.

Amigos e amigas, se vocês quiserem me ajudar, basta estarem comigo. Quando estou triste e me sinto abandonada, é porque os pensamentos destrutivos, alimentados pela culpa, me fazem acreditar que não sou amada. Lidar com isso é complicado, porque já fui rejeitada muitas vezes.

Hoje, sinto estar em uma bifurcação. O primeiro caminho é familiar; sei exatamente onde ele leva. O segundo é um mistério. Apesar de estreito, acredito que ele me levará ao lugar onde devo estar, onde as pessoas que me amam sabem que eu deveria ir. Elas sabem que o primeiro caminho, largo e fácil, é o errado.

Não quero reviver o inferno de agulhadas nos braços ou passar dias inteiros dentro de um hospital, sentindo-me impotente, sendo alvo de piadas de pessoas insensíveis. Sei que um desses caminhos, se não me levar à sepultura, me devolverá aos prédios lúgubres onde ficarei entorpecida por remédios que me impedirão de continuar a faculdade, de escrever meus livros, meus poemas, meus pensamentos.

Por isso, escolho compartilhar minha história, mesmo que alguns digam que estou me expondo. Se isso salvar a minha vida, não me importo. Se algum dia essas linhas puderem salvar a vida de outra pessoa, valerá a pena. Quero dizer que, se você carrega uma ferida na alma, saiba: a comida não é sua inimiga.

Confesso que no último sábado visitei um blog pró-ana, mas percebi que a mulher de 29 anos que sou tem mais discernimento que a de 19. Aquelas palavras são frutos de mentes doentes, calcadas em valores frívolos para agradar homens—algo que, francamente, não quero.

Em 2009, cheguei aos 34 kg, e o amor da minha vida não apareceu. Eu não virei uma thinspiration, nem conquistei aquele “ideal” prometido. Tudo o que esses blogs dizem é um reflexo de uma desconexão total com a realidade. Magreza não traz felicidade. Os ossos aparecendo não são sensuais. Alimentar-se por uma sonda gástrica e ver seus pais chorarem de desespero não é digno de aplausos. 

Eu vivi isso. As pessoas se assustavam com minha aparência. Nada servia em mim: calças caíam, blusas não caíam bem, saias ficavam largas demais, meus seios praticamente sumiram. Meu cabelo estava seco, começando a cair, e meu rosto, magro, exibia olheiras profundas. Nos fins de semana, minha vida era uma solidão extrema. Meu consolo era escrever A Governanta, assistir Chaves, desenhar, escrever poesias e ouvir rock.

Se você tem IMC acima de 25 e deseja uma vida mais saudável, pergunte-se: “Estou feliz com meu corpo ou apenas convencido de que preciso mudá-lo?” Seu organismo é único e tem necessidades específicas. Você é amado (a) exatamente como é. Provar o quê, para quem?

Conheço pessoas que sofrem por não terem opções. Minha vizinha, com diabetes tipo 1 e problemas na tireoide, é muito magra, mas sua condição é consequência da doença, não de vaidade. Ela sofre por não poder comer o que gostaria, por estar presa a uma alimentação restrita e dolorosas doses diárias de insulina. Minha irmã também é um exemplo. Em 2012, após tomar um antibiótico prescrito para acne, desenvolveu alergias alimentares e pangastrite. Ela não pode ingerir glúten ou lactose, mesmo amando comer e sempre sendo grata pela comida.

Penso muito no que enfrentei e, mesmo com os pontos ruins, sou grata a Deus por não ter sequelas intestinais, por ter um coração saudável, por não ter perdido o cabelo, os dentes ou desenvolvido alergias alimentares. Cheguei muito perto da morte, mas estou aqui. Em 2009, quando ganhei uma agenda de presente, lembro de folheá-la e ver tudo branco, como se meu futuro simplesmente não existisse. E poderia realmente não ter existido.

Com IMC 14, eu poderia ter morrido de uma parada cardíaca ou outras complicações graves. Mas estou aqui, e quero encontrar um motivo para viver, para que tudo o que contei não seja em vão. Por isso, deixo um apelo: se você tem um estilo de vida diferente, ótimo. Mas respeite o dos outros. Não imponha sua “verdade” como única. O caráter de uma pessoa não se mede pelo que ela come ou deixa de comer, mas por suas atitudes.

Sobre mim, estou cumprindo meus objetivos: postar Primeiros Erros, deixar o Wattpad e focar nos estudos. Daqui a alguns anos, espero estar formada e dar esse orgulho à minha família. Quero adquirir os conhecimentos da minha área e ter o diploma como realização pessoal. Que Deus abençoe todos esses planos. E abençoe a vocês, amigos e amigas, que colorem minha vida por existirem e fazerem parte dela.



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