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Nina Contra o Mundo | A mulher invisível: quando a inteligência é vista como desvantagem no amor

 


A mulher invisível: quando a inteligência é vista como desvantagem no amor
📌 Por Nina | Os Cadernos de Marisol

Você já se sentiu invisível?

Não por ser tímida. Nem por falta de charme. Mas por ser… inteligente.

Quando a vida nos presenteia com sensibilidade, pensamento crítico, olhar analítico e uma certa acidez bem-humorada, parece que também nos pune com a solidão. Não faltam elogios à nossa “inteligência”, “maturidade”, “brilho próprio”. 

Por que esses elogios vêm sempre de pessoas que nos descartam como opção amorosa?

Nina contra o mundo | O Jurandir do Apocalipse





Enquanto o mundo se despedia de mais um ano com desejos de paz, lentilhas e promessas, ele apareceu: o porta-voz do apocalipse cotidiano. Um homem que se acha o Messias das verdades absolutas, mas é só mais um macho barulhento cuspindo preconceito e achando que tem plateia. Nina estava lá. E ela lembra de tudo.

No inferno toca sertanejo universitário



No inferno toca sertanejo universitário

Assinado por Nina

Não me pergunte de onde vim, porque a resposta é mais feia do que você suportaria ouvir. Sou o resultado de todos os silêncios engolidos, dos “deixa para lá”, dos “pelo menos você tem um emprego”, das lágrimas que secaram antes de cair porque o tempo não me permitia chorar. Sou filha bastarda do cansaço com a indignação, irmã mais velha da raiva contida e amante fiel da ironia. Nasci do grito que nunca ecoou, das vontades que mofaram no fundo do peito e das humilhações que fincaram raízes no estômago.

Disseram que trabalhar dignifica, mas esqueceram de avisar que, para alguns, trabalhar é ser espancada em parcelas, todo fim de semana, com sorrisos falsos e coletes ridículos. Sou atendente. Uma atendente invisível. Uma peça de reposição em eventos que fingem ser alegria, mas fedem a opressão com cheiro de fritura velha. Sou aquela que não tem nome, só um número no colete, como uma presidiária. Aquela que precisa sorrir enquanto é empurrada, xingada, ignorada, usada. Aquela que “está ali para isso”. Aquela que, se responde, é insolente. Se cala, é fraca.

Para sobreviver, escrevo. E escrevendo, sangro. E sangrando, sigo um dia de cada vez. E ainda bem que é um de cada vez.

Cada palavra minha é uma lasca do que me restou depois de mais uma noite de festival onde o povo pagou um salário mínimo para ostentar. Com os tickets de bebidas caras brandindo entre as unhas de gel que não lavam um copo sequer, o olhar de desprezo pelos subalternos. Enquanto isso, a estrela do palco canta com a bunda, os versos desafinados com autotune, e a plateia aplaude como se fosse arte. Arte é sobreviver sem quebrar tudo ao redor, é segurar o grito quando tudo que você quer é sumir. Não tenho palco, mas tenho dor — e é ela que me traz aqui.

Bem-vindos ao inferno. Lá, a trilha sonora é sertanejo universitário.

Crônicas Desbocadas | A escolhida e a esquecida

 Crônicas de uma atendente cansada de ouvir que a vida é justa para quem “merece”.


Tem gente que nasceu com o cabelo certo, a pele lisa, o nome que soa bem até quando o vento sopra. Gente que tem um sorriso no canto da boca, mas um mundo inteiro dobrado aos seus pés. Gente como ela. 

A influencer que minha mãe segue com devoção quase religiosa, a quem chamarei aqui de “a Escolhida”, porque é assim que ela parece se sentir: escolhida por Deus, pelo algoritmo e pelo marido — um sujeito manso, prestativo, que vive se dobrando para atender aos caprichos dela.

A Escolhida é branca, magra, de cabelo escorrido como comercial de xampu. Mora no interior de São Paulo, numa casa que mais parece cenário de novela da Globo, e começa os vlogs dizendo: “Ai, gente, desculpa estar meia desgrenhada hoje” — mesmo com filtro, maquiagem impecável e short de alfaiataria. Diz ser simples, mas não sabe o preço do arroz. Vai ao mercado comprar “besteirinhas” e volta com três tipos de taça, oito coberturas para sorvete e tudo mais que tiver direito.

Ela não lê livros. Não cursou faculdade. Nunca pegou fila no SUS. Nunca apertou o botão errado da catraca do transporte público porque não sabia se a tarifa tinha mudado. Entretanto, é “abençoada” por não se humilhar por uma miséria na escala 6x1, porque tudo que recebe — e que posta — é “Deus honrando” sua fidelidade. Até o fogão novo (porque enjoou da cor do antigo), segundo ela, foi “presente do céu”. Mal sabe a sebosa que seu céu tem o nome do marido e CPF dele na nota fiscal parcelada.

Ela aparece lavando louça, só para fazer charme e se dizer "gente como a gente", e o marido vem por trás, tenta abraçá-la. Ela ri, diz “Ai, sai daqui, seu gordo!” com aquela risadinha sem graça, deixando o coitado constrangido em rede nacional. Ainda assim, ele continua apaixonado. Monta móveis, edita vídeos, embala surpresas de Páscoa e grava com o maior sorriso do mundo quando ela o manda calar a boca. Amor assim só se vê em filmes... de terror psicológico.

Tem dias em que ela chora durante o devocional — não por arrependimento, mas porque ainda não conseguiu a publi de alguma marca renomada. Diz sofrer porque não tinha sequer um frasco de perfume antes do marido. O sofrimento dela é não ser a Virgínia. 

Ela diz que doa amor, mas não doa móveis. Tudo é vendido — até o berço do filho que já não usa. Porque crente que se preza, segundo ela, não se apega. Só fatura.

Enquanto isso, do outro lado da tela, estou eu.  Fardada de colete feio que gonga a aparência, com os pés latejando, a lombar estourada, tentando disfarçar o cansaço, sorrindo para madame véia mal-humorada que desconta em mim se o time perde ou empata, como se fosse culpa minha que o preço dos comes e bebes sofreu reajuste. Na Páscoa, os colaboradores não ganham nem um simples bombom com frase de almanaque. 

A vida, para algumas, é chocolate importado. Para outras, é o amargo da comparação.

Tem gente que sofre e doa o que pode. Que se contenta em ver o outro feliz com o mínimo. E tem quem ostente até a tristeza, ensaiando lágrimas diante da câmera porque não virou capa da VOGUE Evangélica.

E então, como se o altar do consumo precisasse de mais uma oferenda, ela anunciou — com o mesmo tom doce de quem conta uma revelação celestial — que trocou a cama de casal. Não porque quebrou, não porque precisava, mas porque “tava enjoada, gente”. E o maridinho, claro, correu para comprar a mais cara da loja, como um cordeiro devoto a um altar que nem sequer sabe se é amado de volta.

O curioso — ou revoltante, mesmo — é que ela não doa nada. Nada. Tem mães de verdade, com muito menos, que separam os brinquedos das crianças, as roupas que não servem mais, e dão com alegria, com gratidão, com fé em algo maior que o próprio umbigo. 

E o devocional? Continua. Falar o nome de Deus em vão está em alta, dá engajamento. O cabelo, claro, segue escorrido. Porque frizz é pecado. E quem tem não tem cabelo esticado, quem sua, quem engorda, quem tem olheira, quem sofre calada, não tem uma aliança grossa na mão é só mais uma das outras. As esquecidas.

Eu sou uma dessas.

Sou a que vive tentando ver beleza onde o mundo só vê falha.

Sou a que ri sem ter vontade, porque tem gente por perto.

Sou a que se cansa de fingir que está tudo bem, mas finge mesmo assim.

Ela não é simples, e sim o produto final da fábrica de vaidade digital, disfarçada de evangelho, embalada para presente em reels de supermercado com trilha fofa e maridinho acenando no fundo. E enquanto segue vendendo até os cabides da casa para fazer caixa e comprar outra cafeteira “porque agora eu gosto de outra cor”, a gente aqui se pergunta: até quando o mundo vai premiar esse tipo de gente?

E o pior é saber que ela não está sozinha. Que há todo um sistema que alimenta essa farsa, que recompensa o falso brilho, que transforma arrogância em estilo de vida. E a gente, que só quer existir com dignidade, fica no limbo, esperando que um dia vejam valor onde não há filtro. Porque a gente também ora. A gente também ama. No entanto, o que a gente tem não vira publi. Não viraliza.

Ainda tem um pedaço meu que não desiste. Porque, talvez, um dia, Deus olhe para mim com o mesmo filtro que ela usa nas fotos. E diga: “Agora é a sua vez.”

Mas até lá… eu que lute.

— Nina

(a gata borralheira do reino da desarmonização, anti-clean girl)

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