Hoje, 8 de julho de 2014, ficará marcado como um dos episódios mais dolorosos da história do futebol brasileiro. A derrota para a Alemanha não foi apenas um resultado inesperado — foi um desmoronamento das expectativas que estavam nas costas da seleção. Será que este placar reflete apenas o futebol? Ou ele nos faz pensar nos outros "7 x 1" que o Brasil leva diariamente, em tantas áreas críticas?
Quando nos arriscamos, sabemos que podemos tanto ganhar quanto perder. Tudo se resume à forma como interpretamos as situações. Desde o momento em que nos entendemos por gente, começamos a nos habituar aos contratempos da vida. Descobrimos, por exemplo, que Papai Noel não existe. Percebemos também que não existem pessoas burras, apenas habilidades diferentes que cada um domina.
Alguns são líderes natos, outros se conectam com a escrita e fazem maravilhas (ou nem sempre) com as palavras. Existem aqueles que brilham no raciocínio lógico ou no esporte. Todos esses talentos formam a sociedade, com suas diferentes contribuições. No entanto, aqui no Brasil, há um fenômeno claro: o futebol, para a infelicidade de alguns, é superestimado.
Não estou dizendo que estamos proibidos de torcer e sentir. Pelo contrário, o esporte é uma paixão que une e emociona. Mas ninguém deveria morrer por isso. É um exagero sair por aí vaiando e xingando. Afinal, não eram vocês que estavam em campo enfrentando um time forte, não são vocês que estão lá jogando. É muito fácil criticar quando se está sentado no sofá, sem saber nem dar uma embaixadinha.
O lado obscuro da idolatria
Não concordo com muita coisa que ando lendo e escutando. Nessas horas, sinto vontade de abandonar meus sonhos, porque não acho justo que a vida de um jogador como Neymar valha mais do que a de outras pessoas. Por que idolatramos tanto alguém que joga bola e namora uma atriz de novela, enquanto ignoramos outros talentos mundo afora?
Futebol e realidade social
Não vou apontar o que deveria ou não ter sido feito, porque não entendo de futebol. Mesmo que o Brasil tivesse vencido no domingo, isso não mudaria minha vida. Quando vi as imagens das crianças chorando, compreendi sua inocência. Elas entraram no clima, sem entender que esses jogadores são super ricos, enquanto o povo é pobre. Lamento por elas, que ainda não têm um entendimento mais complexo da realidade.
Os atletas terão outra chance de realizar seus sonhos na Copa de 2018, na Rússia. Mas e quanto aos sonhos das crianças que choraram? E os sonhos de tantos outros que não têm as mesmas oportunidades?
Por saúde e educação seis estrelas
Não espero o terceiro lugar no sábado, mas a chegada do dia em que os profissionais da educação, da saúde e da escrita sejam aclamados com o mesmo ardor com que se fala da seleção.
7 x 1 na Educação
Se colocarmos a qualidade da nossa educação em campo, será que conseguimos evitar gols contra? Professores subvalorizados, escolas com infraestrutura precária e um sistema que falha em oferecer acesso igualitário são marcas desse jogo perdido. Enquanto outros países investem pesado em formar cidadãos instruídos, nós mal saímos do meio de campo. Educação deveria ser nossa maior arma, mas continua sendo uma das derrotas mais difíceis de superar.
7 x 1 na Saúde
A saúde pública no Brasil também vive seu próprio 7 x 1. Hospitais sem recursos, filas intermináveis, falta de medicamentos e profissionais exaustos são alguns dos tantos "gols" que o sistema sofre diariamente. Enquanto algumas áreas lutam para oferecer atendimento digno, a sensação de abandono é um eco constante nas vidas de quem mais precisa.
7 x 1 na Segurança
A segurança pública é outro território onde o Brasil não consegue se defender. A violência, a corrupção e o medo continuam sendo protagonistas em um cenário que deveria proteger a população. Os números falam por si, e as estatísticas de crimes e desigualdades acabam reforçando que, nesse campo, o jogo também está sendo perdido.
7 x 1 na Transparência
Se olharmos para a corrupção e a falta de transparência, o placar seria ainda mais desanimador. Estamos no ranking global ao lado de países em guerra ou em extrema instabilidade política. Aqui, o jogo não é sobre bola na rede, mas sobre o desvio de recursos que poderiam transformar escolas, hospitais e projetos sociais. E, como sempre, quem paga o preço é o povo.
Um minuto de silêncio pelas injustiças estruturais
Ninguém chora pelas meninas nigerianas sequestradas pelo Boko Haram. Já se esqueceram delas? Enquanto nos emocionamos com o futebol, há tragédias que passam despercebidas, vidas que são ignoradas. Precisamos refletir sobre nossas prioridades e sobre o que realmente importa.
E os adolescentes israelenses assassinados? As crianças do Oriente Médio que crescem em meio à devastação, guerras e incertezas políticas? Vocês que lamentam por um milionário, já se questionaram sobre o que é sofrimento de verdade?
E os familiares da menina Rachel Genofre, cujo assassino ainda está desaparecido? Rachel também tinha sonhos, arrancados de forma cruel.
Vocês que choram pelo Neymar, reflitam: Isabella Nardoni morreu de uma forma cruel e injusta. Era uma criança linda, pura, cheia de sonhos, que queria aprender a ler. Dois monstros tiraram sua vida, e daqui a poucos anos, migrarão para o regime semiaberto.
E a sensação de justiça, que já é nula, fica como? Para a mãe que perdeu sua filha, quem a traz de volta? Nada.
Alguém se lembra das crianças do Massacre de Realengo? Elas também tinham sonhos. E o que dizer daquelas que ficaram com sequelas? Daqueles que presenciaram um maluco armado entrar numa escola e provocar uma tragédia que nunca esqueceremos?
E as vítimas do acidente da TAM, que completa 7 anos no próximo dia 17? Quatro famílias nunca encontraram os corpos de seus entes queridos. Indenizações não ressarcem os filhos que perderam pais, ou os pais que perderam filhos com futuros promissores. Só porque essas pessoas não eram famosas, seus sonhos não têm valor?
E os jovens de Santa Maria, que tiveram seus sonhos destruídos pela omissão e ganância? Já se esqueceram deles ou a comoção foi só para parecer antenado na internet?
Todos eles tinham sonhos. E há tantos outros nomes que nunca conhecemos, pessoas cujos sonhos também desmoronaram. Ninguém faz reportagens sobre eles. Ninguém levanta hashtags de apoio. Ninguém lamenta por eles.
O milionário daqui a pouco estará na farra, muito bem, obrigado!
Eu concordo com você Mary. Ninguém chora pelas garotas assassinadas em diversos países apenas por quererem estudar. Ninguém chora pela garota indiana que com 14 anos, ficou com o rosto deformado devido ao ácido jogado em seu rosto por um rapaz ao qual ela não dava atenção. Ninguém chora pelas crianças abandonadas, estupradas e mortas covardemente. Pelas pessoas que morrer em hospitais públicos. Minha bisavó ano passado morreu no hospital por negligência médica. Ninguém lamenta. O Neymar não depende do SUS. Nem ninguém da seleção. As pessoas idolatram quem nem fez uma faculdade. Que muitas vezes mal sabe escrever. As pessoas nos estádios se esquecem dos professores que as educaram, dos médicos que as curaram quando ficaram doentes, mas dão valor à pessoas que não tiveram nenhuma participação significativa na vida de ninguém. Realmente, é algo lamentável.
ResponderExcluirObrigada por manifestar sua opinião. Foi muito importante lê-la. Desse modo, você compreendeu exatamente o que eu quis dizer e muita gente distorceu. Você citou exemplos de pessoas que realmente enfrentam sofrimento e não são lembradas, não da maneira que deveriam ser. É triste ver nesses países muçulmanos o desrespeito às mulheres, o ódio com que são tratadas, desmerecidas, resumidas a se casarem para parir, menosprezando quaisquer sonhos que elas venham a ter. Elas mal podem escolher a religião a qual querem servir, não podem decidir se (e com quem) querem se casar, isso lhes é imposto desde a mais tenra infância. Ver as crianças sírias crescendo num país devastado, a mercê da fome, da miséria, da própria morta, vendo as pessoas próximas morrerem numa guerra interminável liderada por um ditador egoísta e sanguinário, mas para a nossa mídia e boa parcela da população, tragédia é não ganhar o hexa, é o atendimento médico do Neymar no campo "demorar". As pessoas falaram dele como se ele estivesse morto, sendo que ele já teve alta, voltou para casa e vai voltar a jogar em breve.
ExcluirEsse povo que fica indignado porque a seleção perdeu é o mesmo que no ano passado gritou nas ruas que queria educação e saúde, mas nesse ano se esqueceu de tudo, esquecendo também que a partir de segunda-feira, quando a copa acaba de vez, tudo volta ao normal, o Brasil ganhando ou não.
Eu vi o Brasil ser Pentacampeão em 2002. No dia foi a maior festa, a TV só falou disso, teve trio elétrico com música o dia todo, foguetórios, até parecia ano novo. Na segunda-feira teve aula normal, e minha professora de português na época falou que a seleção sendo penta ou não, isso não mudava em nada a vida de ninguém. Naquele dia eu discordei dela em pensamento porque ainda tinha só 13 anos, achava o máximo ver Copa do Mundo, já tinha noção da realidade, mas ainda não tanta assim.
Depois que comecei mesmo a lutar pelo sonho de ser escritora é que ficou clara essa inversão de valores, o quanto percebi que nosso país não chora se um escritor morrer, se um médico se for, mas espero que um dia isso mude, que as pessoas não tenham medo de pensar diferente, de agirem para que a realidade mude, mesmo que de fato o mundo não mude, apenas nós mesmos.
Enfim, me desculpe por me estender tanto, mas não pude evitar. rsrs
Abraços!