Às vezes eu vivo como se não
fosse humana.
Finjo não ser real, embora
queira ser.
É difícil de me entender.
Tão difícil que eu me perco.
Queria tanto conseguir
controlar a raiva.
Tenho acessos de fúria que,
claro, não matam, não chegam a ser uma ameaça à humanidade, embora, sim, sejam.
Minha raiva às vezes me
torna cruel.
Sinto vontade de retribuir a
quem me magoou, mesmo que não me sinta confortável, porque tenho lucidez suficiente
para refletir sobre o peso dos meus atos e, claro, ponderar o que serve ou não.
Vingança não me serve de
base para construir meu orgulho ferido.
Parece insano ter
consciência das e errar assim mesmo.
É o preço que se paga por
ser humana.
Mortal.
Por ter uma vida que me foi
emprestada, da qual sou inquilina e não dona.
Sim, eu também amo
profundamente e em segredo, tento na medida do possível não me odiar mais pelo
que sinto, pois ainda me culpo por muitas coisas que aconteceram e ainda não aceito.
Não aceito o amor que sinto,
mesmo amando muito mais do que entendo, menos do que posso, do que deveria.
Eu não sou e nunca vou ser
normal.
Mas não quero ser.
Não quero pertencer ao senso
comum.
Não quero ser só mais uma.
Quero, sim, nunca perder a
simplicidade de viver, só que não ser conformada porque uma coisa não tem nada
a ver com a outra.
Quero apenas viver.
Viver o hoje.
Quero amar a vida.
Eu amo a vida, mesmo às vezes desejando morrer.
Morrer a mágoa.
Declarar extinta a partir
deste instante a timidez.
Morrer de orgulho de ser tola.
Morrer de vergonha, mas não
de desgosto.
Morrer de vontade de viver.
Desejo matar a dor para
viver bem.
Matar a dor antes que ela me
mate de tédio.
Quero produzir algo decente
dessa inércia que me toma.
Talvez eu não seja original nem especial.
Talvez eu seja só gente, só
carne e osso, só um pouco de teimosia.
Uma criança grande em busca
de calmaria.
Um poema sem eira nem beira.
Nem poema.
Não tem verso que resista a
tanto medo de perder o compasso.
Só não quero ser esdrúxula.
Temores a mil.
Não falo o que penso.
Sou rasa.
Uma farsa.
Uma tola.
Repetente na escola da vida,
tropeçando nos erros de outrora que seguem recentes.
Soberba por crer que mereço
o que ainda não tenho.
Não tanto que não possa
recuar.
Às vezes exagerada, no êxito
minimalista de quem fecha os olhos para o que já viu, porque sentir exige de
mim aquilo que não precisa de palavras e gestos para ser certeza, só precisa
existir, e de mim, e de vida para ser o que é, o que eu não entendo nem lendo,
nem me calando...