Onde
estará aquela menina sonhadora e alegre que confiava tanto num
futuro bom? Onde estará as esperanças do verdadeiro amor e as asas
da liberdade, não aquele calor extremo que serviu para acentuar a
dor? Eu não sei mais se haverá algum meio de contato, se o nome
dela não está gravado em alguma lápide por aí, se as cinzas dela
não adornam algum jardim. Morreu e não levei flores a ela. O
gramado cresceu, não vejo mais o muro esbranquiçado nem o que há
do outro lado, as músicas na rádio tanto falam e nada acrescentam,
os programas de televisão não me prendem, meu padrão é o
silêncio.
Eu não estou à venda, não sou exemplo, nem prêmio, a perfeição
não rima, não se contextualiza com aquele reflexo esquisito que
encaro no espelho. Eu não me pareço com aquelas moças bonitas das
capas de revistas, da televisão, não tenho nenhum atributo que me
faça especial. Todos os dias seguem impressos nessa lentidão, Deus
deve ter se esquecido de mim, se é que ele existe, se gosta de mim
tanto assim, por que nunca me ouve, por que nunca atende às minhas
preces?
Estou
perdendo o gosto pelo que mais amo na vida, prestes a lançar fora a
minha desatenção. Estou cansada de me sentir deslocada, de quadra
em quadra tomar fôlego e rodar o mundo atrás de mim. Busco dar o
meu melhor, mas sei que já não possuo mais aquele vigor juvenil, o
entusiasmo caricato de quem desenha o Sol quando ele não está
presente. É dia, mas continua noite. O cansaço está atrás dos
meus olhos tão carrancudos, meus corcundas ombros pedem arrego,
deixam a bagagem em algum canto, desde que não perca de vista o
próximo ônibus. E não há nenhuma poltrona, nem perto da janela
nem do centro, onde eu me sinta confortável. Não há nada de errado
com o mundo – e se há, não cabe a mim consertar se as ruínas já
chamam mais atenção que a humanidade em suma.
As linhas
acrescem o isolamento. Meus amigos vivem com mais qualidade sem o
peso da minha presença. Eu fui proibida de entrar naquela festa
porque não estava a caráter. Ouço risos, novidades, muitos passos,
não dentro da minha casa, onde a repressão custa minha essência e
minha voz soa despercebida pelo corredor artificialmente iluminado. O
futuro não virá. Aquele eclipse foi o último. Sua mão não se
estendeu para me convidar a dançar. Você não me conheceu, sempre
te amei. Vagarei em um sonho ruim até fechar os olhos e continuar
programada para apenas preencher o mundo, sem intenção.
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