regeneração
Ainda
era menina da última vez em que se sentou em um balanço, quando o amor não
passava de um misterioso e difícil idioma de se aprender. Muitos, muitos anos
depois, a mulher atravessava a rua para adentrar um parque. Estava sozinha e o
sol do meio-dia não a incomodava, pelo contrário, a acarinhava.
Escolheu
o balanço do meio, apoiou a mochila ao lado direito dela e sentou-se. Os pés
riscavam a areia fina em busca de impulso para balançar. Os dedos trêmulos
acariciavam as grades enferrujadas pelo tempo, a pintura da madeira também
padecia, porém, os olhos dela miravam o céu em um tom de azul profundo e o lento balançar das folhas na copa das árvores.
As
batidas do coração demonstravam uma genuína gratidão, alinhavam pensamentos e
intenções. A máscara poderia esperar por alguns instantes, fazia sentido
preencher os pulmões com aqueles ares de boas-novas, de um caderno no início,
enquanto a câmera do celular registrava autorretratos de um instante, sorrisos
tímidos e completude.
Ela
havia aprendido a gostar do próprio silêncio e já não temia os próprios
demônios. Além do mais, o coração já não estava mais partido, não havia nada
que a prendesse ao passado e a ninguém, talvez houvesse um pouco de medo de
apaixonar-se e acreditar em alguém outra vez, mas eram questões a serem
debatidas em outra ocasião. Algo improvável há sete anos agora era a melhor
definição para aquela experiência.
Salto
de consciência, troca de pele, despertar... fique à vontade para nomear como
lhe for conveniente, só não desmereça. Ela desceu pelo escorregador e
lembrou-se do quanto precisava de tão pouco para ter um bom dia, apreciar as
mais pequeninas alegrias lhe era caro; para algum desavisado seria uma vergonha
ver uma mulher de trinta e poucos anos e sem filhos brincando no parquinho, no
entanto, ela levava a criança que havia dentro dela para brincar, dedicava-lhe
a atenção sempre relegada pelas obrigações e vivia uma epifania que dispensava
até o bom e velho caderno, embora houvesse muito a dizer, se havia corações
indispostos a sentir a poesia, nada poderia fazer a respeito, o sentimento
predominante no peito dela era orgulho.
O
tempo a trouxe o prezado equilíbrio e as cicatrizes não estão expostas onde
qualquer pessoa possa ver e reabrir a ferida, elas são as tatuagens que adornam
um local profanado e a relembram sempre do quanto foi importante resistir.
Porque a melhor maneira de defini-la é como aquela que pode visitar o deserto
milhares de vezes, voltando de lá cada vez mais forte e convicta do próprio
valor, pronta para tocar as estrelas.
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