Simplesmente Tita - 3ª Temporada - 1º Capítulo



3ª Temporada - 1º Capítulo
Os rumores estavam errados. O novo milênio começaria oficialmente em 2001. Independente de qualquer superstição, o famoso ano 2000 chegou. Era único, como qualquer outro. Os filmes futuristas exageraram ao afirmar que haveria carros voadores e robôs exercendo a mesma função que humanos. Clonagem humana a nível escalar, guerra espacial, teletransporte. Nada disso se cumpriu, nem o tal do Bug do Milênio. Ainda não era possível comprar um lote na lua e refugiar-se por lá quando as coisas por aqui não saíssem do jeito que nossa metódica mente desejasse. Seria uma ótima alternativa. Povoar o mundo da lua. Em um dia não muito distante, talvez.
Os celulares já estavam populares, mas não a ponto de ser um bem acessível a todas as camadas sociais. Os computadores pouco a pouco iam ganhando espaço nas residências. Nem todos possuíam banda larga, portanto sofriam a conexão discada, acessando a internet na parte da madrugada ou em fins de semana após às 14 horas. As salas de bate-papo eram bastante acessadas, pelo que me recordo.
2000 também era aquele ano pelo qual todos esperavam, especialmente os meios de comunicação. Eleições municipais, Jogos Olímpicos de Sydney na Austrália, 500 anos do descobrimento. Quem se entendia por gente no final da década de 90 deve se lembrar de um relógio instalado no centro da cidade o qual era feita a contagem regressiva para o dia 22 de abril.
Especulações à parte, em fevereiro eu ingressaria na 7ª série, conhecida por ser um divisor de águas, a mais difícil do Ensino Fundamental. 13 primaveras em novembro. Enfim, adolescente.
A fase em que meninos e meninas "esticam", em que as paixonites atingem a todas as esferas e muitos começam a descobrir acerca da vocação. Eles se divertiam perdidamente jogando tazos e futebol, enquanto nós falávamos de bandas, amor, maquiagem, pais, parentes, colegas e deles.
Nice subiu a serra durante as férias coletivas para passar as festas de Natal e Ano Novo na companhia da família. Adolfo e Miriam receberam os parentes em casa. Por tamanha de insistência da parte de Olívia, curtimos a passagem ao lado dela e de Clarinha. Vovó estava um pouco melhor naquela ocasião, tendo em vista que o tumor no cérebro era benigno e do tamanho de uma ervilha, felizmente a cirurgia transcorreu sem quaisquer imprevistos e não resultou em sequelas. A mãe de Meire estava tão ativa quanto antes de adoecer. Sua força interior era invejável, lógico que com algumas limitações.
Recebemos o novo ano com peixe, maionese, arroz, lentilhas e de sobremesa um pavê de doce de leite o qual todos repetiram. Horácio estourou um espumante quando o relógio indicava meia-noite e os fogos que enfeitavam os céus também apavoravam os pobres bichinhos que esganiçavam em desespero. Eu, particularmente, odiava os rojões. Levava cada susto que chegava a pular. Para nós meninas, o brinde foi com uma taça cheia de refrigerante.
Após o primeiro almoço do novo ano, Clarinha insistiu para a avó dar-lhe permissão para passar as férias comigo, uma vez que em 2000 a mesma sorte que tive não se repetiria. De fato, não se repetiu. Olívia discordava da neta, dizendo-a que não merecia sair de casa em razão das travessuras. Não entrava em detalhes quando eu a indagava a respeito. Era completamente inflexível nesse aspecto, o que me fazia crer que priminha era a causadora de problemas.
–Eu não quero ficar o verão inteiro te ajudando na cozinha. - Clarinha reclamava, lavando a louça com bastante má vontade.
–Se quiser ter o que comer, vai ter que ajudar. - Olívia varria o chão da cozinha.
–Todo mundo vai à praia, por que nós não podemos?
–Primeiramente porque eu não tenho casa na praia e preciso trabalhar, cuidar dessa casa, de você.
Para cessar o impasse, Meire resolveu acolher Clarinha por 15 dias.
–Desde que Clarinha se comporte.
–Claro que vou me comportar, tia. - Clarinha exalava uma falsa inocência.
–Não sei como tem paciência com Maria Clara porque eu, sinceramente, não tenho. - Olívia admitia, desejando que a neta sumisse de sua vista. - Você teve sorte com Tita.
Meire tinha de concordar. Fazia um bocado de tempo que eu não apanhava. Talvez uns resmungos os quais ouvia cabisbaixa, sem responder-lhe. Sendo assim, a tirana não podia levantar nenhuma queixa contra a minha pessoa.
–Tita precisa muito de alguém da idade para conversar nessas férias... - era a desculpa de Meire para me obrigar a dividir o quarto com Maria Clara novamente.
–Elas são meninas. Talvez a Tita dê uma chacoalhada na Maria Clara e a faça acordar um pouco. 13 anos é uma idade difícil...
Vó Olívia casou-se com pouco mais de 13 anos, portanto foi de extrema necessidade romper os laços com a recente infância para assumir responsabilidades com as quais eu mal sonhava. Melhor dizendo, não sonhava. Minha ideia de chegar aos 13 anos era ser uma menina comum da idade que tem amigos, luta pela aprovação e adora ouvir músicas, passeios e brincadeiras. Embora as bonecas já não fossem mais minhas melhores amigas, estavam guardadas em uma caixa dentro do guarda-roupa. De vez em quando eu as tirava para pentear-lhes os cabelos ou trocar os vestidos. O processo de desapego ocorreu com bastante naturalidade.
Na segunda semana de janeiro, Aline me telefonou para convidar-me a assistir o filme da saga Pokémon que estava fazendo a cabeça da criançada. Adolfo e Miriam também iriam. Primeiramente, Meire negou o pedido e depois voltou atrás, desde que Clarinha me acompanhasse. Após guardar a louça do almoço, separei uma calça corsário azul, uma regata verde clara e uma sandália, deixando as peças esticadas em cima da cama. Clarinha ocupou o banheiro por um bom tempo, saindo quase do jeito que entrou. O cabelo cheirava a cachorro molhado.
–Ai Tita, que bom que deixou minha roupa aí em cima. Eu só tenho trapo e você pode me ajudar a sair bem bonita. Soube que você tem um amigo e pode ser que se eu me arrumar, ele peça para ficar comigo.
–Eu vou sair com essa roupa. - avisei, sentando-me na ponta da cama, irritada com a pretensão de minha prima. Apesar de meu namoro ser uma amizade colorida, eu tinha ciúmes de Adolfo e não deixaria aquela interesseira tomar tudo que era meu.
–Você? Pensei que tinha separado minha roupa. - Clarinha sentou-se na cama para provar minha calça que felizmente não entrou nela. - Ah! Pensando bem, essa calça é muito feia. Pode usá-la.
Preferi usar um vestido mais fresquinho. O banheiro estava cheirando um pouco mal, mas tomei banho e procurei organizá-lo à maneira que podia e vesti-me lá mesmo, colocando o anel que ganhara de Adolfo em meu aniversário. Tirei-o e guardei-o no bolso, com um péssimo pressentimento, um aperto no peito que me indicava maus bocados. Maria Clara sempre teria mais interesse em tudo que me pertencesse.

2 comentários:

  1. Lendo o inicio do capítulo,lembrando de como o mundo era há 14 anos atrás,lembrei do filme de volta pro futuro 2.O personagem principal,o Marty viaja para o ano 2015.E tipo estamos quase lá,mas não é nada de como o filme retrata kkkkkkkkkk
    Tá parei Mary.
    Vamos ao capítulo.Meu coração se aperta só de saber que a Aline vai deixar a Tita (Spoiler) Oh vida!!!

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Foi como num episódio de Os Simpsons em 1995, do casamento da Lisa, o qual acontecia em 2010. Nossa, viajaram totalmente. rsrs
      É verdade. O coração aperta só de pensar que a Aline encerra sua participação na temporada 3. :/ :/ :/

      Excluir

Muito obrigada pela visita ao OCDM, espero que você tenha gostado do conteúdo e ele tenha sido útil, agradável, edificante, inspirador. Obrigada por compartilhar comigo o que de mais precioso você poderia me oferecer: seu tempo. Um forte abraço. Volte sempre, pois as páginas deste caderno estão abertas para te receber. ♥

3 de maio | Dia do Pau-brasil

Post para o Blog: O Dia Nacional do Pau-Brasil, celebrado em 3 de maio, é uma data para refletirmos sobre o legado ambiental e histórico des...