Apesar deles

Sempre soube da verdade, mas vocês desviaram de mim. Tentei dizer e ninguém me ouviu. Quando não, era só a mal-comida, histérica, louca, problemática e até “prostituta”. Argumentos baixos e falhos, de quem não tem competência nem maturidade para manter um diálogo sadio e adulto no qual a outra parte discorda.
As formas de mutilar-me em doses diárias eram inúmeras e nem sempre pude escapar com dignidade, no entanto, sei que não estou sozinha. Eles são monstros que crescem quando o medo me paralisa e não medem esforços para manter-me acuada porque lhes convém o meu silêncio.
A fragilidade das próprias convicções os desarma e então lhes sobram apenas os ditos impropérios que destilam ódio contra vaginas (esse desprezo todo seria despeito?), sem considerar também os sucessivos ataques à aparência, abrindo um precedente para expor outro achismo dos canalhas: uma mulher bonita não pode ser inteligente, de acordo com eles, a inteligência os intimida e não é surpresa alguma a apelação com linguajar chulo que a dita-cuja é feia, velha, gorda e louca, tudo por quê? Porque a estrutura da sociedade ainda os contempla e, munidos de privilégios, não querem perdê-los, não querem reconhecer nem reparar todo o mal que já causaram à humanidade.
Parece bastante conveniente manter o medo, a submissão, a opressão, matar as cabeças pensantes, isso quando não desejam tomar para si os créditos do que nunca fizeram, dizem eles que a voz de uma mulher é inferior a de um homem, o que faria do discurso mais... por assim dizer… tolerável.
Não nasci para ser sombra de um homem, nasci para ser luz, apesar deles. E mesmo que sigam silenciando as vozes que confrontam, nunca poderão nos calar porque a esperança de bons tempos vêm de nossos úteros.