A última pétala da margarida murchou na palma das mãos suadas mais cedo. Cerrei os olhos para não ver, tampei os ouvidos para aquelas palavras não me atingirem. Passei pela porta com não só o coração, como a alma em toda a sua extensão em pedaços.
Cacos e mais cacos espalhados pelo colchão formando o que se entende por um corpo, o corpo de gente, marcado por cicatrizes de todos os tipos e tamanhos, que contam minha história em retalhos tristes porque todas as cores se refletem nesse mesclado confuso e atemporal.
O travesseiro abafou todos os gritos que queria e deveria ter dado, acolheu todas as lágrimas que chorei sem deixar ninguém ver. Não disse nada, nem podia. Apenas chorei, sem pausa nem pudores, posto que as palavras se embaralharam na ponta da língua e se curvaram nesse silêncio consentido, ou melhor, coagido. Olhei para aquele pedaço de mundo que me cercava e me prendia, não encontrei sequer um motivo para ficar.
Pensei em Deus, se ele se lembrava de mim, em perguntá-lo o porquê de nascer assim. Quis escrever, apesar de ser um fracasso retumbante em tudo o que faço. Engoli a vaidade, enumerei mentalmente o que deveria levar na mochila, se quisesse, de fato, encarar as ruas e suas malícias a fim de sair do alvo daqueles que me odeiam. Quanto mais leve a bagagem, melhor. Menos rastros de mim. O maior peso está dentro de mim, não posso partir sem ele porque os cacos pesam, as feridas abertas sangram e incham. Os olhos estão molhados com a fronha, ela chora por não poder ajudar, porém, ninguém pode.
Não importa mais nada. Só quero partir e deixar tudo para trás. Uma vida de frustrações, meu velho eu e a máscara esfarelada. Fracassos, desalento, incompreensão. E me buscar nesse caminho. Ser eu sem ressalvas porque, apesar de ser o mal necessário nas vidas daqueles que se ocupam de me machucar, cansei-me de encarnar o papel do número que impede a conta de fechar, da concepção indesejada, aquela que de esquisita sempre será pechada.
Tentei de todos os jeitos dizer que estava aqui, queria um pouco de amor, encontrar o meu lugar e a minha paz.
Não me julgue. Poupe-se de emitir sua opinião de plástico a despeito de um assunto que não te compete. Nossos pecados são diferentes, nem melhores ou piores; talvez nos encontremos por entre as sulfurosas labaredas onde agoniza a hipocrisia ou num corredor qualquer. Só sei que se não for hoje à noite, amanhã cedo eu vou… eu vou embora…
Extraído do diário da Tita
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