Por que o sabor do chocolate não é mais o mesmo? 🍫



Se você é chocólatra de plantão, provavelmente já se perguntou se o sabor do chocolate de antigamente era realmente diferente do que temos hoje. Talvez, ao abrir uma barra do seu chocolate favorito, essa sensação de que “algo mudou” venha acompanhada de uma pitada de nostalgia. 

As famosas caixas de bombom parecem cada vez menores, embora o preço siga por uma trajetória oposta. Muitos de nós, quando conseguimos comer nosso chocolatinho, percebemos também que o gosto já não é mais o mesmo porque temos a impressão de ingerir açúcar puro com toque de chocolate.  Para facilitar o entendimento acerca desta questão, equipe do OCDM foi em busca de respostas.

Afinal, por que o chocolate não é mais o mesmo? 


Reduflação

As famosas caixas de bombom parecem cada vez menores, embora o preço siga por uma trajetória oposta. Isso ocorre devido a um fenômeno econômico onde os produtos mantêm o mesmo preço, mas têm sua quantidade ou tamanho reduzidos, o que conhecemos como reduflação. Trata-se de uma estratégia muito utilizada pelas empresas para enfrentar o aumento dos custos de produção sem a necessidade de aumentar o preço do produto.

A reduflação explica por que aquela barra de chocolate que antes pesava 200g diminuiu para 180g, apesar de o preço continuar o mesmo. Esse fenômeno não se restringe somente aos bombons, afeta diversos produtos, como biscoitos, bebidas e itens de higiene pessoal. Por mais que essa estratégia possa passar despercebida para alguns consumidores, pode ser um fator determinante, que impacta diretamente a nossa percepção do sabor.

Aqui estão alguns exemplos interessantes de chocolates que passaram por mudanças notáveis, seja na embalagem ou na forma:

  1. Toblerone: O Toblerone reduziu o espaço entre os triângulos em 2016, o que gerou bastante polêmica entre os consumidores. Além disso, em 2023, a embalagem foi alterada para remover o icônico Matterhorn (a montanha suíça) devido a mudanças na produção e às leis de “Swissness”.

  2. Kit Kat: em alguns mercados, o Kit Kat introduziu embalagens mais sustentáveis, substituindo o plástico por papel reciclável. Isso reflete uma tendência crescente de marcas adotarem práticas mais ecológicas.

  3. Sonho de Valsa: A embalagem clássica, que era enrolada e fácil de abrir puxando as pontas, foi substituída por um modelo selado. Essa alteração foi feita, segundo a fabricante, para preservar a qualidade do produto. No entanto, também houve implicações tributárias, já que a nova embalagem mudou a classificação fiscal do produto.

Regulamentações fiscais

Em muitos casos, as regulamentações fiscais podem oferecer incentivos ou reduções de impostos para determinados ingredientes, ou processos de produção. Na prática, a redução da base do cálculo do ICMS pode ser aplicável a óleos vegetais comestíveis, incluindo as gorduras hidrogenadas.

Qualidade do cacau


Além da já citada reduflação, temos um fator preponderante que afeta nossa experiência com o chocolate. Muitas marcas reformulam suas receitas, substituindo ingredientes tradicionais para alternativas mais baratas. Essa alteração pode fazer com que o sabor, a cremosidade e até o aroma do chocolate se modifiquem ligeiramente, como a substituição da manteiga de cacau pela gordura hidrogenada.

No processo de produção do chocolate, a procedência e o preparo dos grãos de cacau podem variar significativamente. Fatores como a colheita, o tempo de fermentação e até as condições climáticas influenciam a qualidade final do cacau. Quando a demanda aumenta, muitas vezes os produtores recorrem a variedades de cacau de qualidade inferior ou a métodos de produção que priorizam a quantidade em detrimento do sabor.

No entanto, há várias marcas que ainda prezam pela alta qualidade dos ingredientes. Vamos conferir algumas que se destacam:

  • Lindt: A marca suíça é conhecida por manter a manteiga de cacau como ingrediente principal em seus chocolates premium, garantindo sabor e qualidade. Famosa por suas trufas e tabletes cremosos.
  • Ferrero Rocher: A empresa tem iniciativas importantes, como o compromisso de obter 100% de seu cacau por meio de padrões de sustentabilidade independentes, como Rainforest Alliance e Cocoa Horizons. Além disso, promove práticas agrícolas sustentáveis e apoia comunidades locais em regiões produtoras de cacau, como Gana e Costa do Marfim.

  • Callebaut: De origem belga, essa renomada marca mantém a manteiga de cacau em suas receitas e é muito utilizada por chefs e confeiteiros, especialmente em chocolates para uso profissional.
  • Tony’s Chocolonely: Focada em criar um mercado de chocolate 100% livre de trabalho escravo, a marca trabalha diretamente com comunidades de agricultores, promovendo práticas sustentáveis e justas.

  • Alter Eco: Conhecida por seu compromisso com a agricultura regenerativa, a Alter Eco prioriza a saúde do solo e a biodiversidade, além de oferecer chocolates orgânicos e de comércio justo.

  • Divine Chocolate: Uma marca única, parcialmente de propriedade de agricultores de cacau em Gana, que promove práticas éticas e sustentáveis em toda a sua cadeia de produção.

  • Beyond Good: Produz chocolates de origem única em Madagascar, com foco em sustentabilidade e impacto local positivo.

  • Majucau: Uma marca artesanal que trabalha com cacau brasileiro de alta qualidade, cultivado de forma sustentável na Mata Atlântica. Eles produzem chocolates sem gordura hidrogenada ou ingredientes artificiais, priorizando práticas éticas e o apoio a pequenos produtores.

  • Cacau Show: Embora seja uma marca maior, investe em iniciativas sustentáveis, como o uso de cacau de origem controlada e programas de apoio a comunidades agrícolas.

  • Kopenhagen: Conhecida por seus chocolates premium, também mantém a manteiga de cacau como ingrediente principal em muitos de seus produtos, garantindo sabor e qualidade

Gordura hidrogenada

Com isso, a gordura hidrogenada é uma matéria-prima mais barata e possui um ponto de fusão mais alto do que a manteiga de cacau, ou seja, o chocolate tem menos possibilidade de derreter em temperaturas mais altas, no concernente à armazenagem e transportes, sobretudo em localidades de climas quentes. 

Além disso, o prazo de validade é maior, em comparação com aqueles chocolates feitos com manteiga de cacau, uma estratégia vantajosa aos fabricantes, que conseguem ter uma margem de lucro maior e correr menos risco de perdas devido ao vencimento dos produtos.

Perspectiva ambiental e econômica

As mudanças climáticas impactam diretamente as plantações de cacau, mas não somente elas. A pressão do mercado global que prioriza a competitividade acima de tudo incentiva práticas agrícolas que podem priorizar a quantidade e a resistências das plantas em detrimento da qualidade dos grãos. Essa iniciativa torna o processo de produção mais volátil, fazendo com que muitos produtores priorizem a padronização, afastando um pouco a autenticidade e diversidade dos sabores naturais do cacau.



Transformação do paladar

À medida que envelhecemos e o nosso cotidiano se transforma, também mudam nossas percepções e sentidos. O paladar é um dos sentidos mais adaptáveis e, com o tempo, pode alterar como percebemos os sabores. O que muitos de nós lembramos com tanto carinho pode adquirir um sabor diferente na atualidade, seja pela mudança natural do paladar ou pelo ajuste interno que fazemos das nossas expectativas.

Essa variação perceptiva é um lembrete de que nossas experiências sensoriais não são estáticas e o que consideramos “ideal” pode depender do momento de nossas vidas e das referências que acumulamos ao longo do tempo.

Nostalgia e memórias afetivas

Não podemos deixar de lado o poder da nostalgia. Muitas vezes, a ideia de que o chocolate já foi melhor é mais uma questão afetiva do que puramente gustativa. Nossas lembranças — momentos especiais da infância, reuniões em família, celebrações — estão fortemente ligadas a sabores e aromas. Assim, quando o chocolate da atualidade não evoca o mesmo sentimento, a mudança percebida pode ser resultado da saudade das experiências passadas.

Será que, no fundo, o que procuramos ao saborear um chocolate não é apenas o gosto, mas a recordação de momentos que marcaram nossas vidas?


Se você gosta de chocolate, independentemente de ser produzido com manteiga de cacau ou não, o importante é a satisfação. Cada barra de chocolate conta uma história que vai muito além do doce: ela é a soma de processos industriais, escolhas econômicas, influências ambientais e, principalmente, de nossas próprias vivências e memórias.

A Páscoa está chegando! Já pensou em como vai espalhar carinho por aí? Seja com um tabletinho de chocolate, um ovo especial ou aquele ovo artesanal feito com tanto amor, o que importa é o gesto. Está em dúvida sobre o que comprar? Quer opções que caibam no seu orçamento? Ou prefere apoiar iniciativas locais e produzir seus próprios ovos? Aqui, você encontra dicas, ideias e muita inspiração para tornar essa Páscoa ainda mais doce, sem perder aquele toque especial que só você pode dar.


Referências

  • BRANDÃO, Carlos. Mudanças e inovações na indústria do chocolate. Revista Cacau, v. 12, n. 3, p. 45-58, 2020.

  • CASTRO, Luísa. Qualidade do cacau: impactos nos sabores do chocolate. Jornal do Sabor e da Saúde, 2021. Disponível em: <https://www.jornaldosaboredaesaude.com/qualidade-do-cacau>. Acesso em: 8  mar. 2025.

  • FREITAS, Gabriela. O chocolate e as memórias afetivas: uma abordagem psicológica. In: Anais do Seminário Internacional de Gastronomia e Memória, 2019, São Paulo. Anais... São Paulo: Editora Gastronômica, 2019. p. 112-125.

  • SOUZA, Roberto. O impacto ambiental na produção do cacau. Observatório Agroecológico, v. 3, n. 1, p. 15-27, 2018. Disponível em: <https://www.observatorioagroecologico.org/producao-do-cacau>. Acesso em: 12 mar. 2023.

  • STANDARD FOR CHOCOLATE AND CHOCOLATE PRODUCTS (CODEX STAN 87-1981, Rev. 1 - 2003). Disponível em: <https://www.fao.org/input/download/standards/67/CXS_087e.pdf>. Acesso em: 11 mar. 2025.

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