Simplesmente Tita - 2ª Temporada - 1º Capítulo



1º Capítulo

Os primeiros dias de férias se passaram com uma Tita tristonha no quarto, deitada na cama chorando, relendo as cartas das meninas, ouvindo as músicas que tocaram na festa e desejando reviver 1998 novamente, até aquela sexta-feira quando meu mundo de sonhos acabou e voltou a ser aquele lugar chato de sempre. 
Reprovar de ano era uma alternativa traidora porque só prolongaria o sofrimento. No entanto, seria bem difícil ter alguma inspiração para ser a melhor em um lugar onde eu era apenas outra idiota a ser zoada.
As coisas melhoraram um pouco quando fui visitar Maria Clara. Para ela, o Natal não tinha lá muita graça. Vó Olívia iria trabalhar na noite do dia 24. Com 11 anos, não tínhamos mais vontade nem paciência para cultuar crenças tão distantes da nossa cinzenta realidade. Nem tanto a minha. Eu sonhava quietinha, no entanto, Clarinha parecia piorar nessas épocas, tão melancólica e amargurada que contagiava.
— Você aí reclamando por não ter aula, Tita. Ai, credo!
— Só porque você não gosta da escola não significa que eu não goste.
— Reprovei, se é o que quer saber.
— E a Vó Olívia deve ter ficado muito chateada. 
— Como se ela se importasse com o que faço ou deixo de fazer.
— Ela se importa, sim.
— Prefiro aqui do que a casa da minha mãe, mas por mim, eu nem estudava mais…
— Mas estudando é o único jeito de você mudar sua história.
— Mudar como? Se tudo já está escrito! 
— Não acho que tudo já está escrito.
— Já está.
— Eu não acho.
— Não acha agora. Depois, você entenderá. Olha, eu sempre serei pobre e inferior, não importa o que eu faça.
— Não é verdade. Se você estudar, terá um bom emprego e, tendo emprego, poderá ter as coisas que quiser porque terá dinheiro. Se você estudar, pode ir para a faculdade e quem faz faculdade, ouvi meus professores dizendo, vão ter muito futuro pela frente.
— Faculdade?
— É... Depois que a gente termina a escola, tem a faculdade.
— Eu já não gosto nem da escola.
— Não veja só o lado ruim das coisas, Clarinha. Eu também pensava assim, mas conheci uma amiga que me mostrou que, por piores que sejam as coisas, nunca são tão ruins que a gente não possa suportar. Essa minha amiga perdeu o pai dela nesse ano, passou por um monte de coisas ruins…
— Que azar!
— Mas você acha que ela se deixa abalar? Muito pelo contrário! Ela está sempre feliz!
— Ela é retardada?
— Não. Ela é grata pelo pouco que tem. Ela sempre pensa que as coisas vão melhorar e não deixa de viver pensando no que os outros vão falar.
Aquele entusiasmo de Aline me fazia falta. Deixar de ser sua amiga e colega de turma seria uma missão muito difícil. Se sorrir não resolver os problemas, pode salvar o dia de alguém. Eu bem que tentei, mas Clarinha não queria nem me deixar falar.
Triste por triste, eu já estava, porém, não acreditava que toda a minha vida já estivesse escrita. Confiava que cabia a mim escolher como queria vê-la, de que maneira encará-la. Desistir da minha felicidade? Não o faria, custasse o que custasse. 
— Puxa vida, Clarinha! Natal é época de otimismo, alegria…
— Nem sempre! Nem para todo mundo!
Mas você acha que Deus fica contente de te ver tão triste assim, Clarinha?
— Eu nem sei se Ele me ouve.
— Se você fala com o coração, Ele te ouve, sim.

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