Arquivo Malacubaca | PÔ PAI - CASOS DE FAMÍLIA: EU SÓ POSSO TER FUNDADO A TERRA DO NUNCA (2012)

 (um oferecimento do Arquivo Malacubaca)

Beto colocava o despertador para tocar pouco antes de começar Bob Esponja na TV. Era sagrado. Mas mal pisava fora do quarto, dava de cara com o pai, Augusto, que não escondia a decepção ao vê-lo em casa em plena manhã de dia útil.

— O senhor não devia estar na aula, Roberto? — perguntou o médico, com a sobrancelha arqueada.

— Pô, pai... Que é isso? Hoje eu não tive as duas últimas aulas...

— Ontem você também não teve.

— Cheguei atrasado porque choveu forte.

— Se não fosse eu te cutucar, você nem saía daquela cama.

— Pô, pai. Eu não ia à aula com chuva.

— Hoje não está chovendo. Por que não está na aula?

— Porque eu já disse... O ‘fessor’ de Física faltou.

Augusto cruzou os braços, desconfiado.

— Que raio de cursinho é esse em que os professores vivem faltando? O que dirá dos alunos? Se não é professor que falta, é porque a matéria não cai no vestibular, ou é semana do saco cheio... Uma beleza. E assim nosso país vai pra frente.

Beto tentou despistar indo até a cozinha, mas Augusto o seguiu, determinado a conversar com o filho.

— Vem cá, Roberto. No meio do ano abrem as inscrições pro vestibular de inverno... Não tem nada que te interesse?

— Pô, pai. Você não quer ter um filho médico? Então vai ter que esperar um pouco mais...

— Em Medicina você não passa, Roberto. Por que não tenta outra coisa?

— Pô, pai. Não dá.

— Não dá por quê?

— Pô, pai... Você não tá sabendo que o trote é muito violento?

— Nem sabe se vai passar e já tá falando em trote?

— E quem disse que eu não vou passar? Pra sua informação, no passado eu só não passei por uma questão. A Federal me sacaneou.

— A Federal te sacaneou por dez anos?

— Pô, pai... Eu já te disse... A Federal me sacaneia todo ano. Num ano que eu gabaritei, não corrigiram; no outro fizeram pegadinha com uma pergunta; e você lembra daquela vez que teve um blecaute? Pois então! Também gabaritei, mas quando refiz a prova só tinha pergunta pra gênio. Pô, pai, vai dizer que isso não é injusto?

Augusto respirou fundo.

— E não se cansa de cursinho, não? Com a sua idade...

— Pô, pai... O cursinho é mó legal, ae! Tenho vários amigos lá, os professores são camaradas, até me falam o que vai cair na prova. Se eu não entrar esse ano é porque a Federal não vai com a minha cara.

— O engraçado é que você fala tanto de aprovação, mas eu nunca te vejo chegar perto de uma apostila.

— Porque eu já sei tudo.

— Ledo engano, senhor Roberto. Enquanto há vida, há o que aprender.

— Pô, pai... A conversa tá boa, mas meu desenho já começou...

Mais tarde, Augusto desabafava com a esposa, Marcela, que enxergava o filho com outros olhos.

— Já está na hora do Roberto amadurecer — dizia ele. — Propus que tentasse vestibular no meio do ano.

— Mas já? — reagiu Marcela, assustada. — O meio do ano tá quase aí, meu bem.

— Pois é. O Roberto já perdeu muito tempo. Se não for medicina, que seja qualquer coisa. Só quero que estude, que faça alguma coisa, que valha a comida que coloco na mesa. O que não dá é ver ele mais um ano escorneado no sofá, vendo desenho animado, achando que eu sou eterno.

— Não seja duro com o garoto, Augusto. Quer destruir o sonho do nosso filho? Ele ainda é um adolescente desnorteado, pressionado por você a decidir o futuro. Se coloque no lugar dele...

Augusto cerrou os punhos.

— Mas não é possível... Só se for a Terra do Nunca! Um não se decide porque ainda é um adolescente... Adolescente de 28 anos! Beirando os 30! E o outro acha que vai virar jogador de futebol!

— E vai, meu bem. O técnico garantiu que dessa vez ele entra no time...

— Estou ouvindo isso há mais de cinco anos, Marcela! Quando é que nossos filhos vão tomar jeito?

— Tenha paciência...

— Se eu tiver mais paciência que isso, viro monge tibetano.

E o que já estava ruim, podia piorar. Blim blom. A campainha tocou.

— Tá esperando alguém, Marcela?

— Não que eu me lembre...

Na sala, Beto assistia A Usurpadora jogado no sofá, quase fundido às almofadas.

— Não vai atender a porta, Roberto?

— E por que tem que ser eu?

Augusto foi até a porta e ao abri-la se deparou com a comadre fofoqueira, a mesma do mercado. Só de vê-la, sentiu calafrios.

— Tuuuudo bem, Gutão? — disse ela, já abraçando o médico.

Augusto odiava ser chamado de Gutão.

— Tudo indo...

— Tudo indo bem?

— Marcela, visita pra você!

A comadre lançou um olhar atravessado para Beto, que ria da novela.

— Você não devia estar na aula?

Augusto respondeu por ele:

— Roberto não passou no vestibular.

— De novo, rapaz? Cê não nasceu pra estudar. Minha neta com 17 entrou de primeira na UFPR... Isso é que é orgulho!

— Quero assistir minha novela, por favor — disse Beto, aumentando o volume.

— Não sei que graça tem ver essa novelinha repetida...

— Ah, dá um tempo, mulher! Quero ver minha novelinha numa boa. Se quisesse ver fofoca, colocava na Sônia Abrão.

Augusto quase riu, mas se segurou. Detestava a comadre, que só sabia falar da vida dos outros.

Marcela chegou com sorriso forçado.

— Oi, amiga!

As duas se abraçaram.

— Sempre linda, Marcelinha — elogiou, falsa. — O tempo não passa pra você.

— E nem pra você...

— Esses seus filhos são folgados, hein? Um vendo novela do tempo da minha vó e o outro?

— André tá tentando a sorte como jogador. Ano que vem vai pra Copa!

— Tá velho demais pra isso, amiga...

Beto, já de saco cheio, levantou e foi para o quarto.

Foi aí que Augusto teve uma ideia ousada: procurar ajuda. Abriu o notebook, digitou “filhos parasitas” e encontrou o site de um programa de TV famoso por lidar com situações absurdas. Casos de Família estava recrutando casos para um especial. Sem contar a ninguém, ele se inscreveu.

— Se não responderem, entendo...

Mas responderam. E na semana seguinte, a família Prado Mendes embarcava para São Paulo.

— Lua de mel, amor? — perguntou Marcela, animada. — Pra onde vamos?

— Resolver um grande problema.

— Pô, pai... Mó chato isso... Nem uma passadinha no Hopi Hari?

— Hoje mesmo você toma jeito. E não se fala mais nisso.

— Pô, pai... Vai me levar pra conhecer a Christina Rocha ao vivo? Mó emoção!

— Vai virar homem no grito.

No estúdio do programa, a chamada já deixava claro que o circo estava armado.

— O Roberto é o eterno adolescente, mas já faz mais de dez anos que ele se formou no ensino médio — dizia Augusto.

— Como é que é isso, seu Augusto? — perguntava Christina Rocha, olhando para a câmera.

— Pô, pai... Você nunca me dá nada… — choramingava Beto.

— E quem deu tudo que você tem? Fada madrinha é que não foi! Além de parasito, é ingrato!

Fim da chamada. Início do caos.



Era uma tarde como qualquer outra nos estúdios do SBT, mas Christina Rocha já sabia: o episódio daquele dia prometia ser memorável. Ao entrar em cena, foi ovacionada pela plateia, que já havia lido no GC o tema do programa: "EU SÓ POSSO TER FUNDADO A TERRA DO NUNCA".

Com seu carisma habitual, ela saudou todos: — Boa tarde, minha gente maravilhosa! Tudo bem com vocês? Tudo certo? — e, sem perder tempo, lançou a pergunta central: — Você é pai, mãe? Tem filho que já passou da idade de brincar de carrinho, mas ainda acha que vive na Terra do Nunca?

O caso que abriria o programa era o de Augusto, um médico indignado, que declarava com todas as letras: estava sustentando um parasita. O filho, Beto, adolescente que terminou o ensino médio há mais de dez anos, ainda morava com os pais e se dizia adolescente. Christina o chamou ao palco.

— Roberto, entra aqui pra explicar melhor essa história. 

— Roberto não, pô. Meu nome é Beto...

O pai, ao lado, já fazia cara de poucos amigos. Christina manteve o tom leve: 

— Certo, Beto. Então você é adolescente... 

— Pô, e meu pai não entende isso!

A plateia explodiu em vaias quando Augusto comentou: 

— Infelizmente, ele ainda mora comigo. 

— Pô, pai. Que é isso? 

— Que é isso digo eu.

Christina quis entender melhor: 

— Augusto, ele terminou o Ensino Médio há quanto tempo? 

— Há mais de 10 anos. Diz que faz cursinho, mas nunca vi ele pegar em uma apostila.

Beto protestou: 

— Pô, pai. Isso é calúnia. Eu estudo! 

— Quando, Roberto? Quando que eu não estou sabendo? 

— Quando não tem aula no cursinho, pô. 

— Todo dia, né?

A discussão ganhava contornos cada vez mais surreais. Augusto ergueu a voz: 

— Sou eu quem paga o cursinho. Tenho o direito de saber se meu dinheiro está sendo jogado no ralo.

Beto, sem perder a pose: 

— E paga porque é dever do pai! 

— Até a maioridade! 

— Mas eu ainda sou adolescente, pô. Meus direitos estão garantidos no Estatuto. 

— Estatuto da parasitagem, só se for...

A plateia reagia a cada fala com vaias ou gargalhadas. Christina tentou entender: 

— Roberto... ou melhor, Beto... Você trabalha? Faz alguma coisa?

Augusto respondeu por ele: 

— Nada. Só exige. Não merece nem o prato que eu coloco na mesa. 

Marcela, a mãe, enfim se pronunciou: 

— Você pressiona demais o menino, Augusto. Ele é apenas um adolescente. 

— Adolescente? Eu só posso ter fundado a Terra do Nunca!

Christina achava tudo aquilo inacreditável: 

— Beto, você não trabalha? 

— Eu trabalho! 

— O que você faz, então? 

— Toco Guitar Hero...

Augusto se levantou da poltrona: 

— Isso não é trabalho! 

— Pô, pai. Eu ganho experiência... 

— Então já pode se aposentar!

Beto tentou explicar: 

— Eu tenho uma banda. Tô ensaiando, divulgando... 

— Que banda? Você nunca ensaia com ninguém! 

— Os caras são preguiçosos. Mas um dia vai...

Marcela, sempre tentando defender: 

— Viu como ele é desmotivado, Christina? O Augusto nunca apoia os filhos. 

— Apoio? O que você acha que venho fazendo desde que esse folgado nasceu?

Christina questionou: 

— E quem trabalha nessa casa? 

— Eu! Eu sustento todo mundo. Essa cambada de malucos.

A plateia gargalhava. Christina chamou um rapaz da última fileira para comentar. Ele estava de blusa azul: 

— Ô cara, toma vergonha na cara. Já passou da hora de crescer, mano!

Beto retrucou: 

— Eu trabalho sim. Não sou remunerado, mas tenho satisfação.

A senhora da blusa rosa também deu seu recado: 

— Beto, tu é jovem, bonito... Sai dessa de parasitar e ajuda teu pai, guri. Isso é vida?

Beto fez cara de deboche: 

— Eu só trabalho com uma condição: se eu for o chefe.

A plateia caiu na gargalhada.

Augusto ergueu os braços: 

— Tá vendo, Christina? Essa é a cruz que eu carrego.

Christina tentou encerrar: 

— Pra ser chefe, tem que estudar, Beto. 

— Quem disse que eu não estudo? Tá me chamando de parasita, sei lá... 

— Que bom que a carapuça serviu — provocou Augusto.

Mas ainda havia mais. O segundo caso era de Regina, mãe de Bidu. O rapaz, com 26 anos, também não estudava nem trabalhava, e ainda trouxe o namorado para morar com a avó, dona Ofélia.

Regina entrou tímida: 

— O Bidu é agressivo, Christina. Se não faço as vontades dele, ele me xinga.

— Ele trabalha? Estuda? 

— Gosta de balada. Sai sexta e só volta na segunda, quando volta. E agora trouxe o namorado pra morar com a gente... e o namorado consegue ser ainda pior.

Quando Bidu entrou, veio acompanhado da avó, que mal esperou para aplicar-lhe uma bengalada nas costas: 

— Mentiroso! Tá vivendo da minha pensão! Vagabundo!

A plateia foi ao delírio. Dona Ofélia desabafou: 

— Se fosse criado por mim, não virava isso. Hoje é só pai frouxo e mãe cega pra marmanjo vagabundo. Vão trabalhar, seus imprestáveis! O tempo de farra acabou!

Christina encerrou o episódio do dia com a frase que virou bordão: 

— E o pior de tudo... é que eu só posso ter fundado a Terra do Nunca! 

Em meio ao caos, Christina anunciou: 

— E voltamos com o Casos de Família. O tema de hoje é: Eu só posso ter fundado a Terra do Nunca.

Dona Ofélia estava revoltada. Apontando a bengala para todos os lados, ela encarou Bidu: 

— Esse vagabundo vive no bem-bom com minha aposentadoria. Sou viúva de um ex-desembargador, e ele só me dá desgosto.

Christina arregalou os olhos: 

— Seu falecido esposo era desembargador? 

— Sim, sim! Morreu de desgosto por causa dessa desgraça aí!

Bidu tentou se defender: 

— Essa velha vive me culpando por tudo!

E levou outra bengalada.

— Velha uma ova! Velho é trapo. Me respeita, seu folgado. A Regina se queixa pra mim, mas quando tento colocar ordem, ela chora e protege esse parasita. E não adianta ficar vermelha, Regina!

A plateia aplaudia de pé. Marcela cochichou com Augusto: 

— E você ainda reclama do nosso filho...

Christina retomou: 

— Regina, não te deixam dar ordens? 

— Regina é uma pamonha, Christina. Vive chorando pelos cantos porque o Bidu não presta, não para em emprego, dá golpe na praça.

— Ele dá golpe na praça? 

— Vive com carnê na mão e não paga nada. Tá com o nome sujo, o da mãe, o do companheiro... Menos o meu. Porque comigo não se brinca!

Mais aplausos. Christina leu um dado: 

— Diz aqui que Regina vendeu o carro pra pagar a faculdade do Bidu, mas ele desistiu.

Regina tentou justificar: 

— Bidu não gostou do curso...

— Nem ia às aulas! — gritou Ofélia, acertando mais uma bengalada.

Beto, na lateral, comentou: 

— Pô, pai... Ainda bem que nunca te dei prejuízo.

— E os 10 anos de cursinho? Grande investimento...

Christina chamou perguntas da plateia. Uma jovem falou: 

— D. Ofélia, tiro meu chapéu pra senhora. Bate nesses parasitas!

E ela retribuiu: 

— De tanto bater, uma hora endireita. Pensam que por ser velha estou largada? Estou mais viva que nunca!

A plateia gritava: 

— Ofélia! Ofélia! Ofélia!

Com bengala em punho, ela ameaçou Beto e Bidu, que correram pelo estúdio. Ofélia foi atrás.

Christina, às gargalhadas: 

— Vamos conversar civilizadamente... Produção, ajuda aqui!

Outro participante da plateia comentou: 

— Seu Augusto, o senhor gosta de sustentar o parasita.

— Gosto uma ova!

— Se não gostasse, já tinha botado pra fora.

Ofélia virou sensação na internet. As hashtags “#Ofélia” e “#BateNosParasitas” lideravam os TTs do Brasil. Christina mal conseguia conter o riso:

— Depois de hoje, Augusto... vai mudar alguma coisa?

— Vai. Lá em casa, as regras mudam. — Ele mostrou a lista de Páscoa de Beto. — Veja se não tenho motivo pra chorar.

— Pô, pai... 

— Acha que outro pai aguentaria? Eu sou benevolente!

— Você é duro demais — disse Marcela.

— Eu já teria mandado esse aí pra rua — completou Ofélia. — A boa e velha terapia da bordoada ainda funciona!

— Betinho é muito bem criado, para a sua informação, tia da bengala. Cuide do seu neto.

— Bem que merecia umas bengaladas...

— Então vem dar...

— Vontade não me falta nem um pouco.

Christina tentou apaziguar:

— Por favor, gente. Sem violência. Quem tá aqui vai falar, mas também tem que saber ouvir... E não é só ouvir o que quer.

Beto comentou com o pai, em tom de brincadeira:

— Nunca pensei que eu ia ver a dona Florinda ao vivo...

Christina ouviu e se divertiu:

— Você gosta de Chaves, Beto?

— Pô, meu, Chaves e Bob Esponja são minha inspiração. E você também. Não perco o Casos de Família por nada. Sou seu fã!

— É mesmo?

— Pô, meu. Sou sim.

Empolgado, ele se levantou para abraçá-la. Bidu, ali no canto, deu uma risadinha debochada.

Na plateia, uma jovem pediu o microfone:

— Minha pergunta é pro Bidu. Você não tem vergonha de ser caloteiro, não?

Bidu virou-se com desdém:

— Não te perguntei nada. Vai pagar minhas contas? Não. Então cala a boca.

A plateia vaiou. A moça não se intimidou:

— Tinha que levar mais bengalada pra ver se aprende a responder com educação, ô parasita caloteiro.

A temperatura do palco subiu. Bidu retrucou:

— Essa gente nem sabe de nada e já quer dar opinião. Vão pro inferno! Eu tô nem aí!

Ofélia, sem paciência, mandou:

— Mas lá em casa você não entra mais.

Regina, desesperada, suplicou:

— Mãe, isso não!

— Isso sim, Regina. Viemos resolver isso e vamos resolver já! Se fosse pra passar a mão na cabeça dele, eu dava um cheque em branco. Consertar chuveiro, nada. Varrer o quintal, nada. Mas pra alargar a bunda em frente ao computador, tá sempre disposto!

Augusto riu:

— Roberto é outro que não sai da frente do computador.

— Pô, pai. É meu trabalho...

— Que trabalho, criatura?

— Pra me manter!

— Então quem deu tudo que você tem, han? A Fada Madrinha? Além de parasita, é ingrato.

Ofélia se meteu:

— Abre o portão e dá um chute na bunda desse encosto!

Marcela entrou na defesa:

— Faça isso com seu neto. Na minha família você não se mete.

— Também não é assim — ponderou Augusto. — Roberto é meu filho.

— Mas você reclama dele o programa inteiro! Parece que gosta de sustentar o encosto!

Bidu zombou:

— Depois reclama de mim. Pelo menos eu não sou como esse aí.

— Pô, mané! Olha o respeito! — Beto respondeu.

— Se situa, Amendobobo.

Beto bateu no peito:

— Amendobobo sim, senhor. Antes isso do que caloteiro.

— TE PERGUNTEI ALGUMA COISA?

— Pô, meu. Você começou. Quer briga, vai ter!

— Vai ter e você vai apanhar!

Começa a tocar "Eye of the Tiger".

Bidu se levanta. Beto também. Os dois se encaram, pulam para trás, fazem soquinhos no ar. Uma briga à la Chaves, coreografada, sem socos de verdade. Mas o teatro logo vira pastelão quando Bidu tenta desferir um soco no ar, se desequilibra e... caí no chão.

A plateia explode em gargalhadas.

— Bem feito, mané! Muito bem feito! — Beto faz uma dancinha da vitória.

Antes que virasse MMA de verdade, Christina intervém com firmeza:

— Nada de briga aqui! Se não se acalmarem, vou chamar o segurança. Aqui não é bagunça. Se quiserem resolver alguma coisa, é com diálogo. Dona Ofélia, quer falar mais alguma coisa?

A vóvis nem pensou duas vezes:

— Quem vem aqui tem que querer resolver. Mas muito pai adora bancar parasita, aí não tem sermão nem bengalada que resolva. Eu vim pra jogar sério!

Regina tentou defender o filho:

— Mas ele não tem pra onde ir...

— Vai aprender. Que vá pegar no batente e pare de dar trabalho. E você não tem obrigação nenhuma de levar e buscar vagabundo no cursinho! Vai à aula, mas só mexe no celular. Vestibular nada. É desculpa pra continuar no bem-bom. Quem tá estudando mesmo não posta meme o dia inteiro!

— Não faz mais que sua obrigação! — rebateu Bidu.

Ofélia não deixou por menos. Acertou uma bengalada leve na cabeça dele:

— OBRIGAÇÃO? Deveria era te acertar nos dentes pra ver se aprende a falar com uma senhora! Não tenho obrigação de te dar nada... Só umas bengaladas!

— Essa vó não brinca em serviço — comentou Christina.

— Pô, meu... E depois o folgado sou eu, né? — Beto sacudiu os ombros.

— Embate entre o sujo e o mal lavado... — concluiu Augusto.

O psicólogo do programa comentou sobre a pressão da geração de Beto e Bidu para conquistar o mundo ainda na juventude, discorrendo sobre a transformação do mundo, que impactou o mercado de trabalho e, consequentemente, os anseios da juventude. Ficou claro que Marcela, ao tentar dar aos filhos o que não teve, acabou alimentando a eterna adolescência dos filhos.

Com os depoimentos encerrados e as gravações finalizadas, Beto conseguiu tirar uma foto com Christina Rocha e deixou os estúdios ladeado pelos pais.

— Estou passada com aquela velha maluca — reclamou Marcela. — Ela te machucou muito, filho?

— Pô, mãe. Que nada...

— Ela que vá cuidar do neto imprestável dela!

Augusto respirou fundo:

— Ela é meio exagerada, mas falou umas verdades.

Caminhando de braços dados com os dois, Beto anunciou:

— Pô, pai... Pô, mãe... Ouvi os clamores do paizão aqui e vou tentar vestibular no meio do ano. Quero ser adulto logo.

Augusto rebateu, sem paciência:

— Adulto você já é, Roberto. E faz tempo. Não banque a criancinha.

— Pô, pai. Você nunca me apoia em nada...

— Depois não quer que o menino esteja desmotivado — disse Marcela, abraçando o filho. — Mal ele abre a boca e você já grita, Augusto.

— Se acha meu método severo demais, posso mandar o Amendobobo morar com a titia Ofélia.

— Não largo meu Gutao por nada. 

— Gutão é a mãe!


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