Exposição desnecessária? 🌈

 


O texto original foi escrito no dia 16 de junho de 2018, no entanto, foi reeditado, revisado e teve alguns trechos reescritos. Além disso, no último dia 28 foi celebrado o Dia Mundial do Orgulho LGBTQIA+. Nos últimos anos pensei ser lésbica, mas após muita reflexão, me entendo hoje dentro do espectro da assexualidade; o sexo não é o centro da minha vida, porém, também não é uma parte a ser ignorada; posso viver sem, mas não descarto a possibilidade de ter intimidade.

Exposição desnecessária?

A comunidade LGBTQIA+ é composta por pessoas que ultrapassam a linha tênue entre o preto e o branco, o binário e o não-binário, o medo e a coragem. Pessoas que às vezes falam, às vezes se calam, que devem sim carregar com orgulho a bandeira que levantam porque SOBREVIVEM.
Hétero pode beijar na boca e transar no horário nobre que ninguém reclama, está tudo certo, tudo belezinha, tudo conforme manda a natureza. Pode mudar o status de relacionamento no Facebook, postar textão esdrúxulo no Dia dos Namorados, se agarrar em público, ter perfil de casal, se casar e sair mostrando o álbum da festa até para o tiozinho do carro do sonho que ninguém vê problema.
Se o casalzinho hétero pode se expor, por que uma pessoa LGBT não pode? Por que ela não pode exprimir o seu amor e pronunciar corretamente o pronome da pessoa amada? Por que ela não pode caminhar de mãos dadas com a sua mulher sem ter que soltar as mãos quando aqueles olhares enviesados cruzam-se com os delas? Por que viver com medo de abrir caixas de mensagem? Por que ela não pode mudar o status do relacionamento numa rede social? Por que ela precisa esconder a orientação sexual para obter uma vaga de emprego? Por que ainda insistem em dizer que ser quem ela é trata-se de uma “exposição desnecessária”?
Você diz: “tudo bem ser gay/lésbica, não tenho nenhum preconceito, mas não precisa expor tanto porque é desnecessário, as pessoas não precisam saber”, só que mesmo que você afirme com todas as vogais e consoantes não ser uma pessoa preconceituosa, VOCÊ É.
Por trás desse seu discursinho demagogo e puritano há sim um preconceito gigantesco que te rebaixa no meu conceito porque quando você expõe o seu ódio disfarçado de opinião, faz com que muitas pessoas desejem não existir.
Muitas pessoas.
Pessoas como eu.
Pessoas como os meus amigos que também erguem essa bandeira.
Pessoas ao redor do mundo, que pagam às vezes com a vida.
Pessoas que mesmo tendo milhares de divergências entre si lutam por um ponto em comum: a visibilidade.
Porque quando um coração é atingido pelo preconceito, todos são.
Então, por gentileza, limite-se a opinar apenas quando for solicitada e antes de emitir qualquer parecer, reflita.
Você nunca precisou temer ao andar na rua acompanhada de homem porque ninguém nunca lhes lançou olhares de repulsa ou mesmo te agrediram com tapas e palavras. Você pôde e ainda é livre para exercer sua sexualidade sem que digam que você está confusa, que é só uma fase ou pura libertinagem, ninguém te excluiu da casa de Deus e te condenou ao inferno. Ao inferno aqui na Terra.
Essas pessoas que te incomodam estão lutando pelo direito de andar na rua sem ser espancadas por andar abraçadas ou de mãos dadas com quem amam, o de discordar do sexo biológico no caso de não se identificar com ele e ser quem realmente é, usar o pronome que se adequa ao seu ser, de ser tratado com respeito e igualdade, de não ser preterido no mercado de trabalho e estereotipado na mídia, ridicularizado em programas humorísticos, invisibilizado até na literatura, isso porque não mencionei os países em que pessoas são mortas só pelo fato de serem homossexuais, onde os direitos para essas minorias são negados, onde o direito de amar é negado.
Ninguém está querendo privilégio, se vitimizar, destruir a família de ninguém porque o que destrói uma família é a desunião, a falta de compaixão, educação, não uma alma colorida. Ninguém vai bater na porta da sua casa e te obrigar a virar lésbica, então não compreendo o motivo da sua aversão a quem nunca se opôs ao seu jeito de amar, suas escolhas, nada.
Por que você tem tanto ódio dos LGBTS? Por quê?
Ninguém decide de veneta “virar” lésbica só porque o último namoro fracassou. Tem gente que se descobre cedo e com muito peito encara o inferno que é o ensino fundamental quando se é diferente de todo mundo. Tem gente que se descobre, como eu, mas se esconde e tenta seguir o bando, porque tem noção do perigo e opta pelo silêncio até dispor de recursos para conquistar a independência financeira e emocional. Tem gente que se descobre numa certa altura da vida e se permite, enfim, viver e se conhecer, se amar, sem preconceitos porque às vezes por puro medo muitas pessoas entraram em casamentos de fachada e viveram uma vida de ilusão. 
Cada um se descobre do seu jeito. Cada história é uma história. O reconhecimento, a autoaceitação e o autoamor são processos longos e arrisco-me a dizer que nunca terão fim. Até que as estruturas tornem-se mais resistentes às hostilidades veladas ou não, a batalha é pela sobrevivência. O meio de sair do casulo é imenso, mas esse espaço já está pequeno e desconfortável demais, mesmo sendo o único lugar seguro para abrigar-me nesses tempos de angústia, dúvidas, incertezas, quando a solidão é um buraco esmagador e lancinante queimando dentro do peito noite após noites. 
Dói sempre como se fosse a primeira vez quando pessoas que eu tinha em alta conta se mostram capazes de estraçalhar meu coração com simples palavras ou com a total falta de diálogo, de empatia e de compaixão, além da invisibilização, das piadinhas preconceituosas. Em relação a algumas é possível ter alguma esperança, elas podem compreender a verdade se quiserem, já outras devem ir para o vaso sanitário da história.
 Essa luta consiste em engolir o choro, ter peito de se olhar no espelho todo dia de manhã e dizer baixinho a si que não existe nada de errado em ser o que se é, vestir um sorriso à prova de muitas idiotices e sair para o mundo, sair sem certeza de retorno. E a cada dia que passa, ao final dele, colocar a cabeça no travesseiro e dizer baixinho que sobreviveu.
Orgulho? Talvez!
Orgulho de ainda saber sorrir quando tudo o que mundo nos oferece é ódio, portas fechadas, falta de educação. Orgulho de não impor preceitos para amar. Orgulho disso e muito mais porque por trás do arco-íris tem muito sangue derramado.
No seu mundinho é irrelevante saber que pessoas saem de casa ou até são expulsas por não poderem contar com o apoio de quem diz amar incondicionalmente… Mas que porcaria de amor é esse capaz de fazer um pai expulsar um filho de casa só por ele ser gay? Ou espancar, matar, obrigar a “voltar para o armário”?
Isso está longe de ser amor!
Então, isso que você chama de “exposição desnecessária” é um coletivo de pessoas que mesmo tão diferentes entre si são tão iguais porque todas, todas, todas elas, dentre as quais eu me incluo, estão buscando seu lugar no mundo, buscando mais do que “aparecer”, causar, criar modinha, estão querendo viver.
E ao que conste, viver sufocado em um armário enquanto a vida passa não é viver.
Viver com medo de choros e represálias também não é viver. E outra coisa: as pessoas não escolhem de quem vão gostar. Os sentimentos superam nosso entendimento, como explicar aquilo que não tem explicação?
É sério mesmo, não perderei tempo nem lágrimas discutindo com uma pessoa de pensamentos tão retrógrados, tendo em vista que preciso ir lá me expor um pouco para no futuro uma menina qualquer crescer consciente de que a ideia é amar, amar a quem quiser, porque amor não tem rótulo.
E não pretendo retirar o post, pois esta é a minha opinião, este é o meu espaço e pessoas como você não irão me calar nunca mais.

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