Os Desencontros do Cupido | Primeiro Capítulo

💘 "Dia dos Namorados? Prefiro um boletim extraordinário."
Enquanto vitrines se enchem de corações e promessas de amor eterno, Eduardo Meirelles parece mais interessado em escapar da pressão romântica do que em celebrá-la. Na edição especial de hoje, acompanhamos um dia atípico — ou nem tanto — em Balneário dos Anjos, com direito a tensão na redação, provocação da Noviça, desdém pelas datas comerciais e bastidores da Malacubaca. Porque nem todo mundo vê o dia 12 de junho como um conto de fadas. E, cá entre nós... quem nunca quis sumir nessa data?

🚌✨ Leia agora o primeiro capítulo de "Os Desencontros do Cupido" e descubra o que acontece quando o cinismo de um jornalista encontra o perfume floral da provocação.


Primeiro Capítulo


Balneário dos Anjos, 31 de maio de 2001.


A cidade de Balneário dos Anjos despertava com a luz dourada do amanhecer refletida nas águas cristalinas de suas praias. As ondas do mar acariciavam a areia branca, enquanto as gaivotas voavam em círculos no céu azul. O cenário era perfeito, com o calçadão movimentado, onde moradores e turistas caminhavam, andavam de bicicleta e aproveitavam o clima ameno. As ruas estavam repletas de bares, restaurantes e lojas, dando vida ao coração da cidade costeira.

No meio da movimentação, uma van branca com o logo da Malacubaca destacava-se na via rápida, cortando a paisagem da cidade. Dentro do veículo, Eduardo Meirelles estava distante, imerso em seus pensamentos. Ajustou os óculos de sol e suspirou, olhando pela janela, enquanto a cidade passava em um borrão. Para quem via de fora, Balneário dos Anjos era o cenário perfeito para se apaixonar. Para ele, era só o pano de fundo de mais um dia de trabalho. Entregou a fita ao mototaxista e seguiu para a próxima gravação.

— Não consigo entender o porquê desse desespero todo acerca do Dia dos Namorados — comentou Eduardo, com um tom de desdém. — Doze de junho é só um dia como qualquer outro: 24 horas. Todo mundo acorda cedo para fazer o mesmo que fez no dia 11 e fará no dia 13. Por que a cisma com o dia 12 em especial? 
— É dia de sair para namorar a patroa — respondeu Zulmir, o motorista, sorrindo. — Vou levá-la ao restaurante e depois a gente namora… 
— E os outros 364 dias? — rebateu Eduardo, com o olhar cético.

Edson, cinegrafista e amigo próximo de Eduardo, decidiu entrar na conversa com um tom malicioso: 

— Parece que você se desiludiu, Meirelles. Qual é o problema? 
— No Valentine’s Day, ao menos os solteiros podem participar, presenteando pessoas queridas, como familiares e amigos — retrucou Eduardo. — O Dia dos Namorados, por sua vez, exclui os solteiros e enaltece apenas o amor romântico. 
— É por isso que se chama Dia dos Namorados. 
— Sei disso, dã. Mas acho que as pessoas preferem estar com alguém, mesmo sem amor, por costume, conveniência ou pura preguiça de começar tudo de novo.

Edson não perdeu a oportunidade de provocar: 

— O lance com a Lulu já acabou? 
— Uma coisa não tem nada a ver com a outra — respondeu Eduardo, sem querer aprofundar.

Zulmir lançou um último comentário enquanto estacionava: 

— Fala isso o sujeito que pode namorar quem quiser e prefere ficar solteirão. Está atacado porque vai trabalhar no fim de semana, né?

Com a proximidade do Dia dos Namorados, crescia no íntimo de Eduardo o desejo de tornar-se um ermitão. A desculpa, entretanto, era a mais esfarrapada possível: fugir das cobranças insistentes de sua atual companheira, Luciana Andrade. Atriz renomada e uma das mulheres mais desejadas do Brasil, Luciana era quase impossível de agradar e tinha grandes expectativas para o Dia dos Namorados, pressionando-o a “caprichar na surpresa”.

💘💘💘

De volta à emissora, Eduardo tamborilava os dedos na mesa enquanto encarava a tela do computador. Artigos e gráficos sobre o impacto comercial da data piscavam incessantemente na tela. Tudo parecia ecoar a mesma ladainha: promessas de vendas recordes e declarações otimistas. Enquanto revisava as últimas informações, o murmúrio da redação ao redor parecia distante, quase como um fundo musical para sua irritação crescente.

— E aí, Meirelles, bloqueio criativo? — perguntou Carmen Angélica, conhecida na redação como Noviça, enquanto se aproximava com sua xícara fúcsia. — Não me diga que está matando serviço para escrever historinhas de amor?

O perfume floral de Noviça envolvia o ar quando ela se inclinou sobre a mesa de Eduardo com um sorriso provocador.

— Eu? Escrevendo historinhas de amor? Desde quando? — rebateu Eduardo com um meio sorriso.

Noviça continuou, os olhos brilhando: 

— Muitas declarações de amor em mente? 
— Declarações de hipocrisia, isso sim. — Eduardo soltou, exasperado.
— Não pensa em me mostrar? — provocou Noviça, inclinando-se ainda mais. — Você bem sabe que não gosto de ser a última a saber das coisas.

Para Noviça, cada interação com Eduardo era um fragmento especial, cuidadosamente guardado. Apertou a xícara entre os dedos, como se fosse um segredo quente demais para largar. Mesmo que ele não percebesse o significado por trás de suas provocações, ela sabia que sua distração era uma proteção contra algo mais profundo.

Eduardo revisou mentalmente o texto que acabara de escrever, uma leve sombra passando pelo rosto. 

— Sua praga pegou no ano passado, viu? — brincou ele. — Posso contar com você neste ano?

Ela soltou um riso nervoso, tentando disfarçar a lembrança amarga.

— Credo em cruz, vire essa boca para lá! — devolveu Noviça, sentindo um arrepio frio ao se lembrar do Dia dos Namorados anterior.

Embora fosse chamada de “grinch” pela filha, Noviça sabia que o Dia dos Namorados era a pior data para ela. A tristeza sempre surgia ao fim de maio, inevitável como o nascer do sol.

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Na tela da emissora, a reportagem de Eduardo sobre as expectativas do comércio para o Dia dos Namorados ia ao ar. As imagens mostravam vitrines decoradas e casais caminhando pelas ruas, enquanto Eduardo narrava:

— Com o Dia dos Namorados se aproximando, comerciantes estão otimistas com o aumento das vendas em comparação ao ano de 2000. Enquanto consumidores se preparam para gastar mais, impulsionados pelas promoções e pela atmosfera romântica, será que todo esse entusiasmo é sustentável?

No estúdio do Vinte Horas, o âncora William Bastos Marques ajustava os papéis à sua frente antes de se despedir do público: 

— É em clima de romantismo que o Vinte Horas de hoje fica por aqui. Mais notícias a qualquer momento ou no Malacubaca Noite. Nos vemos amanhã!

Antes dos créditos, o locutor oficial da emissora surgiu com o anúncio especial: 

O mês dos namorados chegou com novidade na telinha da Malacubaca! Não perca, na próxima segunda-feira, a nova novela das nove: Elos Perdidos, uma história de paixão, suspense e intrigas!

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Na redação da Malacubaca, o burburinho pós-jornal era sempre mais barulhento que o próprio noticiário. Eduardo seguia tamborilando os dedos na borda do computador quando William Bastos Marques passou por trás da cadeira com sua tradicional xícara de café preto na mão.

— Você ainda vai morrer solteiro, Meirelles — disse William, sem sequer parar de andar, com aquele tom meio risonho, meio paternalista.
— Prefiro isso a morrer enfeitado — retrucou Eduardo, ajeitando os óculos de sol mesmo dentro da redação, como quem acabara de receber um flash na cara.

William soltou um riso abafado e se afastou, mas deixou o rastro da provocação no ar. Noviça, que acompanhava a troca com os olhos, fingiu concentrar-se em seu bloquinho de anotações, mas não conseguiu conter um suspiro leve. A conversa havia distraído por um instante o pensamento sombrio que teimava em voltar: o plantão do ano anterior.

Ela fechou os olhos por meio segundo, mas bastou. A lembrança do sequestro do ônibus invadiu sua mente feito sirene de ambulância. Os gritos, o suor, o terror no olhar das vítimas. E o peso de ter desejado, mesmo sem maldade, que algo “extraordinário” acontecesse para tirá-la do drama do Dia dos Namorados.

Foi culpa minha?”, perguntava-se em silêncio, como fazia nas últimas semanas.

Sacudiu a cabeça discretamente e sorriu, como se estivesse apenas espantando um pensamento bobo.
Componha-se, Carmen Angélica. Você é profissional.

Enquanto isso, dois estagiários cochichavam próximos à impressora:

— É verdade que a Bilu volta ao Vinte Horas semana que vem?
— William até cortou o cabelo...

Eduardo ouviu de longe e soltou um sorriso enviesado.

Isso vai dar o que falar, pensou. Mas não era da Bilu que ele queria fugir naquele junho.

Era do amor.

Ou, pior: da expectativa dos outros sobre o amor.

💘💘💘

Antes de sair da redação, Eduardo recebeu uma notificação no pager. Era uma mensagem de voz deixada por Luciana Andrade — ele já sabia o tom só de ver o número.

"Edu… você não vai esquecer da surpresa, né? Quero algo à altura. As flores do ano passado foram… ok, mas um pouco simples. Não combina comigo. Um jantar no mínimo cinco estrelas. E nada de desaparecer de novo, hein? Beijo, amorzinho."

Ele desligou o aparelho e fechou os olhos por um segundo, como quem levava uma topada no meio da alma. Respirou fundo, mordeu o lábio inferior e guardou o pager no bolso.

— Amorzinho... pois sim.

📺 No próximo capítulo (27 de maio, às 20h)

Bilu Valdez retorna ao Vinte Horas após um ano fora da bancada — e reencontrar William Bastos não será o maior dos desafios. Christiane dos Anjos e Carmen Angélica também enfrentam suas próprias dores e esperanças enquanto o cupido da Malacubaca prepara mais uma rodada de desencontros.

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