Mary Recomenda | A bela Rosalina - Natasha Solomons

 

Quando ser a “esquecida” salva uma vida inteira

Por Mary Luz

Independentemente de gostar ou não, tenho certeza de que você já ouviu falar da história de amor entre Romeu e Julieta, certo?

Na edição de hoje do Mary Recomenda, não trago a icônica obra de Shakespeare, mas uma releitura de Rosalina, que na peça original é brevemente mencionada como “um amor antigo” do Romeu. Este é o nosso ponto de partida para uma jornada de 360 páginas que nos leva para a Verona medieval, onde Julieta Capuleto vivia seus últimos dias de inocência.

Venha, o cocheiro dos Capuletos nos aguarda. Suba nessa carruagem, Rosalina nos aguarda no verdejante pomar.

Autora: Natasha Solomons

Editora: Companhia das Letras

Páginas: 328

Gênero: Ficção histórica, drama psicológico

Ano: 2024


Quando comecei A Bela Rosalina, sabia que era uma releitura de Romeu e Julieta, mas não esperava sair da história com os olhos marejados, o coração em silêncio e a mente em ebulição. Esta não é apenas uma inversão da narrativa clássica — é um resgate. Daquelas vozes que Shakespeare deixou à margem. Das meninas invisíveis que sobreviveram. Das Rosalinas do mundo.

Rosalina Capuleto é jovem, órfã de mãe e invisível dentro da própria casa. Cresce sob o luto não resolvido, o desprezo do pai e a frieza do irmão. Como tantas meninas da era medieval, tem sua vida decidida por homens: se não se casa, vai para o convento. A liberdade feminina não era um destino; era um desvio. E todo desvio cobrava um preço alto demais.

Mas o que Solomons faz com essa personagem que antes era só uma nota de rodapé no cânone shakespeariano é de uma beleza silenciosa. Rosalina, ainda que sem voz no início, encontra uma força que vem da dor, do silêncio e da ausência. A autora dá a ela o que nunca teve: protagonismo.

O Romeu aqui é um sedutor em série. Um garoto bonito que joga palavras como iscas, caça emoções frágeis, promete eternidades — e some. Seu amor dura menos que a asa de uma libélula. Julieta, a prima doce e crédula, se vê enredada nesse teatro. E Rosalina, mesmo ferida, mesmo ainda se odiando por acreditar, escolhe proteger Julieta. Ser para ela o que ninguém foi para si.


🌹 Uma leitura que rasga e costura


Não vou dizer que me vi na Rosalina. Mas posso afirmar com convicção que todas nós — em algum momento da vida — se não temos uma cicatriz, ao menos conhecemos alguém marcada por uma. Meninas e mulheres que acreditaram em seus Romeus, enredadas pelo lovebombing, pelas promessas intensas e grandiosas, apenas para depois serem descartadas como se o amor tivesse prazo de validade. É então que se percebe: o tal “Romeu” era só um sujeito volúvel, egoísta, narcisista, interesseiro e falso.

A jornada de Rosalina é mais que redenção — é resistência. Enquanto todos esperam uma tragédia, ela resiste. Enquanto todos esperam obediência, ela confronta. Enquanto todos esperam o silêncio, ela escolhe salvar. E isso muda tudo.


✍️ Impressões finais


Natasha Solomons afirma que Shakespeare nunca foi à Itália, mas conhecia bem as estruturas de sua Inglaterra elisabetana. É por isso que A Bela Rosalina pulsa com ecos de hoje: porque os papéis podem ter mudado de nome, mas muitas estruturas seguem de pé. Esta releitura faz mais do que homenagear Shakespeare — ela o desafia, o complementa, o transforma.

E deixa um recado forte e necessário: às vezes, sobreviver é o ato mais revolucionário que alguém pode cometer.

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