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Após encerrar a transmissão, Noviça ficou emburrada porque não encontrou o medalhão no bolo. Ela olhou para os lados e ouviu duas senhoras de idade comentando.
— Soube que a Noviça é casada! — disse uma delas.
— Capaz! — exclamou a outra senhorinha, cobrindo a boca.
— Ela falou agora há pouco no jornal!
— Casou com o tal do Vespúcio?
— Decerto. Vai ver por isso não deixam os dois juntos no mesmo jornal.
— Nada a ver, Almerinda! Os dois do jornal da noite lá, daquela mocinha bonitinha com o bonitão, os dois têm um trelelê.
— O Vespúcio? Casado? Ele não me convence!
— Ele tenta se convencer…
— Se eles forem casados, deve ser pura fachada.
As senhorinhas deram uma risada fina, comentando que Vespúcio era um gato e só assistiam ao noticiário da hora do almoço para vê-lo. Noviça se fez de sonsa, mas seus olhos brilharam ao ouvir a conversa indiscreta das duas senhorinhas. Então não sou a única a desconfiar da masculinidade do Vespúcio, pensou ela.
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Luciana Andrade estava impaciente. Na sala de maquiagem da Malacubaca, ela andava de um lado para o outro, os saltos ecoando no piso cerâmico. Seus olhos faiscavam enquanto encarava Elísio, um dos assistentes de produção, que mal sabia onde se esconder. Ele, com um avental azul cheio de manchas de maquiagem, segurava uma esponja como se fosse um escudo.
Elísio tentou se esquivar, mas Luciana bloqueou o caminho com um movimento ágil, como uma felina preparada para o ataque.
Luciana o encarou por mais alguns segundos antes de soltar um suspiro dramático.
— Se você não vai me ajudar, eu mesma descubro. Conheço fontes que fariam qualquer coisa por um café comigo. E quando eu descobrir, Elísio, não pense que sua falta de cooperação será esquecida!
Elísio respirou aliviado quando Luciana deixou finalmente a sala, mas sabia que não estava livre do furacão. Enquanto ela saía pelo corredor iluminado, soltou uma última provocação, falando alto o suficiente para que todos ouvissem:
— Não importa onde ele esteja. Se está aprontando alguma, meus queridos, é melhor que ele me tema mais do que ao gerente do hotel, porque ninguém foge da Lulu!
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Carregando uma sacola retornável, Noviça adentrou a redação e saiu distribuindo potinhos quadrados com fatias do bolo de Santo Antônio. Um colega, sapeca, quis pegar um, mas foi repreendido:
Noviça entregou o potinho a Bilu e Christiane e se sentou para tentar a sorte. Pela expressão desoladora, presumimos que não houve sequer sinal do medalhão.
— Que bolo gostoso! — exclamou Bilu.
— Já comi melhores! — rebateu Noviça.
Bilu cutucou o garfo no bolo e, de repente, reconheceu o medalhão. Christiane, percebendo a expressão da amiga, perguntou:
— Que cara mais apavorada é essa?
Bilu largou o garfo.
— Isso aí já é página virada, meus amigos. Se vier, que venha algo novo.
— Se mentira matasse, você já tinha caído dura!
— Pode até ser, mas sozinha não estaria!
Christiane, que nunca encontrava o Santo Antônio nas outras vezes, decidiu dar uma chance ao bolo. Ela se emocionou ao dar a primeira garfada e encontrar o medalhão.
Bilu revirou os olhos de um jeito cômico.
— Ah, aposto que foi E de Edu…
— E foi mesmo!
— Tenho certeza de que agora vai.
— Eu não teria tanta certeza assim… — discordou Christiane, enciumada.
— Esse harém está com os dias contados, diga-se de passagem! — rebateu a diva.
— Quem achou o medalhão fui eu! — Christiane bateu com as mãos no peito. — Fui eu!
— Eu deveria ter tirado uma foto do tronco para te mostrar, caso você não esteja acreditando.
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Bilu retirou-se da conversa e dirigiu-se a outro canto da redação, onde encontrou William, que havia saído de uma reunião.
— Biluzinha!
Eles se cumprimentaram com as cordialidades de sempre, emendaram alguns diálogos triviais e ele, curioso, inquiriu-a sobre a saga da Noviça.
Eles se aproximaram, intensificando a silenciosa tensão sexual que se erguia como uma muralha diante deles. O toque proibido, mas cobiçado. Palavras que se formavam e se acumulavam no céu da boca e morriam.
Depositou um terno beijo na testa dela e retirou-se. Se ela seria capaz de aceitá-lo para firmar um recomeço, era incerto.
Jaqueline contou nos dedos das mãos que ao menos cinco casais empolgados do dia anterior se separaram somente naquela tarde, sendo a sorveteria um cenário inusitado. Não era pessoa de alegrar-se com a desgraça alheia, mas questionava se as pessoas amavam ou saíam dizendo e banalizando o sentido. Refeita do dia anterior, não recebeu tantas gorjetas, como também não teve folga. Outra garçonete adoeceu.
De qualquer forma, encontrou-se com Rodrigo ao fim do expediente e conversaram sobre diversos assuntos.
O toque. Ela já havia chorado nos ombros de Rodrigo antes. Eles atravessavam ruas perigosas de mãos dadas. Noviça estava equivocada. Eles eram apenas bons amigos. Havia precedentes para dúvidas?
Ah, o toque.
Jaqueline deu o primeiro beijo aos 13 anos, quando a maioria das meninas já estava no segundo namorado. Foi contagiada pela magia ímpar do amor de verão, quando conheceu um skatista chamado Rick. Aquela velha história de que implicância demais só podia ser sintoma de paixão. Dois beijos e um adeus.
Rodrigo ouvia as histórias de amor dela e de Letícia, no entanto, desconversava quando alguém tentava especular e conseguiu se safar daquele inferninho de a turma tentar arranjar um esquema para ele beijar na boca, nem que fosse na marra. Ele reparou que seus sentimentos em relação à Jacky mudaram quando confessou informalmente a um primo que ela era a menina mais bonita que ele conhecia, superando até artistas de grande projeção.
Após verbalizar tantos pensamentos que até então não tinham muito espaço, ficava cada vez mais impossível mentir a si. Não tinha muito a fazer senão aceitar. Tê-la ou não. Só se esforçava para preservar a amizade.
O toque.
Deu-se num lapso. Para qualquer outra pessoa seria algo de pouca importância. Jaqueline não era o tipo de garota sugestionável. Nunca seria mesquinha a ponto de despertar ilusões em Rodrigo, fazer joguinhos e deixar rastros de dor pelo caminho. Ninguém tinha culpa dessas coisas. Ele era o irmão que não teve. Seria muito estranho vê-lo de outra forma.
O soco no estômago só doía porque era a realidade nua e crua se fazendo notar.
Irritada, Jacky parou de pedalar e parou na calçada. Rodrigo fez o mesmo.
Jaqueline e Rodrigo nunca tiveram uma discussão feia. Talvez não concordassem em alguns pontos, mas nada digno de preocupação porque as afinidades sobrepujavam as eventuais diferenças. Um era o porto-seguro do outro, qualquer outra pessoa que os observasse tiraria a mesma conclusão. Qualquer pessoa, exceto a própria Jaqueline.
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